domingo, 8 de janeiro de 2012

Travessa da Rua da Palha


  
Depois mudamos para a Travessa da Rua da Palha nº 57, que oficialmente é denominada de Rua João Batista do Nascimento em homenagem a um antigo barbeiro da cidade. Já a Rua da Palha rende homenagem a um antigo prefeito que construiu e inaugurou o antigo Coreto em 1914, nos registros da Prefeitura é Rua Coronel Manoel Pereira Borges. Nossa mudança sempre era realizada no sistema das formigas. Um a um, os móveis e objetos iam sendo transportados pela família e por amigos. Caminhão? Nem pensar!

     Da Travessa da Rua da Palha há boas lembranças como, por exemplo, da festa de São João que era muito animada em função do nosso vizinho Seu Aprígio que adorava aquele momento festivo e soltava muitos fogos fazendo a animação da garotada e dos adultos. Seu Aprígio Malaquias da Silva era um senhor muito interessante e passava muita alegria para as crianças principalmente em épocas de festa. Ele era porta bandeira do Clube Carnavalesco Taióba que pertencia à União de Artistas e Operários. Num confronto que houve ao lado da Igreja Matriz, entre o Bloco Taióba e o Bloco Pão Duro que pertencia à Sociedade Beneficente dos Trabalhadores de Itabaiana, quebraram o mastro da bandeira do Bloco Taióba. Como nas casas que ficavam no entorno da matriz ainda havia muitas cercas de vara, imediatamente Seu Aprígio se apossou de uma delas e fez novamente hastear o pavilhão do seu Bloco que a partir daquele momento passou a ser conhecido como Bloco Vencedor. O que me intrigava em Seu Aprígio era uma brincadeira que ele chamava de “Trico”. Ele tanto tirava o trico nos seus filhos como nos do vizinho. Falava para mim: - Neninho vamos tirar o trico! Ora, o que ele fazia? Pegava nossa orelha fazia um carinho, depois soprava os dedos da mão, principalmente o polegar, o indicador e o médio e em seguida dava um beliscão, com o polegar e o médio apoiado no indicador, bem na pontinha da orelha, na parte de baixo aonde se coloca brincos. Depois soprava novamente os dedos e dava dois estalos em sequencia. Essa brincadeira “sui generis” ele a chamava de “Tirar o Trico”. Às vezes esse trico era tão forte que causava pequeninos ferimentos na orelha. As melhores festas de São João que vivi foi na Travessa da Rua da Palha, muitos fogos, fogueira uma atrás da outra, cada vizinho batalhando para ver quem fazia a melhor fogueira. 

     A fogueira de São João é um símbolo sagrado para o nordestino. E a cerimônia começa ao acender a fogueira à noitinha do dia 23 de junho, véspera de São João, quando todos se encontram para presenciar o pai botar o fogo inicial. Ninguém sai dali até que o fogo tome conta da madeira. No outro dia a reverência à fogueira ainda continua quando se observa aquela fumaçinha dizendo: - “Ainda estou aqui!” É quando junta-se os pedaçinhos de madeira que ficam no entorno e os coloca no centro das cinzas, e aí a fogueira como  a fênix, ressurge das cinzas. Era a época do “Trio Nordestino”; “João Gonçalves” e dos “Três do Nordeste” e dos grandes sucessos dos forrós de Antonio de Barros e Cecéu.

     Quadrilhas, comidas derivadas do milho e balões faziam parte da festa. Era um tempo em que a televisão ainda era muito escassa e poucas pessoas podiam adquirir uma. Em função disso nos reuníamos à noite para brincar. As brincadeiras eram coletivas e todas as crianças da rua participavam. Brincávamos de roda, quando cantávamos: “Fui à Espanha buscar o meu chapéu...”; “Atirei o pau no gato...”; “O pião entra na roda...”; “Escravos de Jó...”; “O cravo brigou com a rosa...”; “Samba lêlê está doente...”; “Pai Francisco entrou na roda...”; “Eu sou rico de marré...”; “Se não for o da frente há de ser o de atrás...” entre outras. Brincávamos ainda de baleado, pão quente, roda, cola, garrafão, barra bandeira entre outras brincadeiras infantis. Período em que minha mãe tinha um papagaio que cantava a música “O nosso amor traduzia felicidade e afeição...” que era sucesso de Paulo Sérgio. Esse papagaio era o xodó da casa, quando morreu fizemos o seu velório com tudo que tinha direito.

(Do livro “Eu e a Rainha – de menino a rapazinho”, de Romualdo Palhano)

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