quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Vai doer agora!


Erasmo Souto

Conheci Mané Salu nas terras de seu Nicácio, em Maracaípe, mais precisamente na venda de Zé de Biu, onde eu costumava saborear umas cocadas com pão francês da padaria de João Belezinha. Grosso qual parede de igreja, Mané Salu era dado a umas lapadas de aguardente, que ele mesmo chamava de “consola corno”. Naquela ocasião apresentou-me sua esposa Clarinda:

- Essa é minha vaca...

Apertei a mão da mulher, observando o olhar amarelado no seu rosto. Saí dali incomodado com tamanha subserviência, mas dias depois fiquei sabendo que ela soía devolver com chifres os insultos dessa ordem.

Novo encontro com Mané Salu sucederia numa terça dia de feira em Itabaiana na venda de Severino Carlos, pertinho da casa dos meus pais na antiga Marechal Deodoro. Conversava eu com Geraldo Carlos, filho do dono da mercearia e um dos meus melhores amigos de juventude, quando explodiu a ordem de Salu:

- Uma lapada de “Consola Corno”...

Severino serviu-lhe um copo quase cheio de aguardente e recebeu dele um limão.

- Racha pra eu? – pediu e logo foi atendido pelo merceeiro.

Pegando uma das bandas do fruto, Salu levantou o copo e espremeu o caldo na cachaça. Quem sabe por artes do Diabo, um pouco do sumo foi ter ao seu olho direito. Vendo-o coçar o olho atingido, perguntei-lhe:

- Tá doendo, Salu?

- Tá nada. Vai doer agora! – e espremeu a outra banda do limão no olho esquerdo.

(Do livro “Sua majestade o povão” – Adquira pelo site www.livrorapido.com)

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