Jovens praticam balé no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar |
“Nesta cidade não acontece nada”, reclama, desolado, um rapaz morador na cidade de Itabaiana, 90 quilômetros da capital João Pessoa, 26 mil habitantes, isolada por péssimas estradas e governantes idem. Fui jovem nesta cidade quando o mundo era analógico e a realidade não era digital. Sem ser saudosista, vejo que o mundo mudou de forma impactante nas últimas décadas, mas a rapaziada está cada vez mais sem orientação. A nova geração que se comunica em redes esqueceu de armar a rede da vivência gostosa, daqueles modos de vida do interior. Olhando com os olhos de ontem, vejo que a rapaziada não faz acontecer.
No meu tempo não se tinha à mão as novas tecnologias da comunicação, mas a moçada era menos apática. Nem sei se naqueles tempos bons existia depressão, síndrome do pânico e outros males modernos. Motivos havia: o medo era “nosso pai e nosso companheiro”, como no poema de Drumond. Também não tenho certeza de que a ausência da massa de informações que se tem hoje, do tipo midiático global, capitalista, ajudava os meninos e meninas da era 70/80 a encontrar sua vocação de cidadãos, mexendo com arte e cultura ao mesmo tempo em que guerreava no front político.
Hoje não acontece nada na cidade e quase ninguém agita a vida social. Tirando os eventos elitizados e restritos como os blocos de cordão de isolamento e as festinhas à base de “paredão” e música infame, as novas gerações e atores sociais ocupam menos o espaço público, ou seja, só se juntam para beber no meio da rua, um bando de gente que tem pouquíssimas opções de lazer. Esse povo são os sem-futuro, por vezes até sem-presente.
A experiência no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar me deu a certeza de que o público tem medo de consumir produtos culturais. Elitizaram tanto os eventos que o cidadão comum só se sente bem no meio da multidão que levanta as mãozinhas no ritmo do forró de má fama e suas letras abjetas. Não temos casas de cultura, e os poucos acontecimentos artísticos são blindados ao público. O jovem da periferia se sente excluído nesses ambientes. Fica bem marcada a hierarquização da sociedade. Não há o prazer do entretenimento, as pessoas têm medo de serem diminuídas. Os jovens, portanto, ficam submetidos ao que está na grande mídia de massa com tudo o que isso representa de maléfico para a formação do cidadão.
O Ponto de Cultura sempre pretendeu ser uma casa que abriga a cultura geral. Não queremos levar cultura à população, restrito a eventos. O povo tem sua cultura, não precisa levar o que já existe, nesse movimento unilateral que sempre caracterizou as raras políticas públicas de cultura neste país. Temos que buscar ampliar o olhar da população através de eventos culturais consumidos pela minoria privilegiada, mas não se pode parar por aí. O básico é que a moçada tenha oportunidade de se expressar artisticamente. Essa é a maravilhosa lógica do Programa Cultura Viva, do Governo Federal: ao invés de chegar com o pacote pronto, incentivar e colocar algum recurso nos movimentos culturais já existentes nas cidadezinhas e periferias, levando em conta as características de cada comunidade.
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