Ainda existem pessoas solidárias. Foi assim: levei
uma queda na rua, cortei a mão e torci o tornozelo. Um motorista de táxi
comprou garrafinha de água e me deu para lavar o sangramento e tomar uns goles,
passar o nervosismo. Depois, uma senhora de ar humilde me pegou pelo braço e me
levou para o hospital.
No caminho, outro motorista ficou impressionado com
o sangue que jorrava da minha mão, parou o carro e me deu uma toalhinha para
fazer torniquete. No hospital, fiquei na emergência esperando o doutor. Ali não
encontrei muita solidariedade. Os enfermeiros duros, insensíveis. O ambiente
com alta voltagem de desumanidade e destrato com pessoas pobres.
A mulherzinha tirou meu relógio, lavou meu braço na
pia imunda da sala de emergência e disse que iria esperar. “Precisa não, a
senhora já me fez uma grande caridade, eu me viro”. Esperou ainda uns 30
minutos. Disse que vinha do Valentina, estava procurando um setor para arrumar
remédio de graça para o marido doente. Foi embora, mas ligou para meu celular
cujo número pegou na recepção.
--- É da casa do seu Fábio?
E eu:
-- É, sim.
--- Olhe, tou ligando do hospital São Vicente, ele
teve um acidente e tá aqui na emergência.
--- Tá bem, obrigado.
Voltou para me certificar de que meus familiares
estavam a caminho. Achei comovente tanta bondade. Nem perguntei o nome da
senhora. O celular era da recepcionista.
Depois de muito tempo, eu já com vontade de me
mandar daquela porcaria de hospital, chega o doutor. Era o Mestre Maçom
Guilherme Sarinho, amigo do meu pai, também da maçonaria lá em Sapé. Mandou
tomar antitetânica e antibiótico. Eu quase o mandava tomar no arengueiro.
Gostaria de reencontrar aquela mulher que se
importou com o sofrimento de um estranho na rua, demonstrando empatia
verdadeira, de maneira amorosa e misericordiosa. Ela, uma desvalida, vista com
inferioridade por muitos, como proscrito e renegado ao segundo plano é todo
pobre nesse mundo injusto.
Existem essas pessoas que
cruzam nosso caminho, ficam só um tempinho de nada e já seguem para outras
paragens, mas marcam definitivamente. Pois se um dia eu conseguisse fazer uma
lista justa das pessoas que valeram a pena conhecer, a mulherzinha do Valentina
iria para as cabeças. Pessoa maravilhosa. Quis a vida que nos encontrasse em um
momento tumultuado. Seria o tal anjo da guarda de que falava minha professora
de catecismo, há séculos passados? Pelo sim ou pelo não, vai uma flor vermelha
para essa senhora do subúrbio, que me reconheceu como semelhante e me deu a mão
na hora da dor.
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