sábado, 30 de julho de 2011

Aplausos para dona Célia do Jardim Veneza


Eu e dona Célia na Rádio Comunitária Diversidade
          
          O que faz uma dona de casa ceder um cômodo de sua residência para um grupo de rapazes e moças instalar uma rádio comunitária, mesmo sabendo dos riscos que corre? E se essa mesma dona de casa achar a ideia tão generosa e boa que passa a fazer parte do projeto, dando sua contribuição no apoio logístico, na solidariedade e força à equipe? É acreditar que a solidariedade e a união dos simples gera saberes e simpatia, ternura, conforto e assistência moral para pessoas que não têm quase nada.

Foi isso que levou dona Célia a se tornar uma combatente e construtora da Rádio Comunitária Diversidade, no bairro pobre do Jardim Veneza em João Pessoa. Mobilizou os vizinhos e amigos para dar força à rádio, fez rifas, festas e outras atividades para levantar recursos. Com esforço e sacrifício, adquiriram os equipamentos da rádio de baixa potência e a festa começou. Foram seis anos no ar com programas educativos, entrevistas, música da boa e participação ativa de vários atores da cena periférica local, que podia ser um técnico de enfermagem passando dicas de saúde, um professor, a enfermeira do posto de saúde, os artistas e lideranças comunitárias. A rádio criou um vínculo muito forte na comunidade.

Um dia, chegou a polícia. Agentes da PF e da Anatel pararam o carrão preto na porta da rádio e tentaram entrar. “Aqui não entra ninguém sem documento do juiz”, disse dona Célia, enquanto o locutor do horário escapava com o transmissor pela porta dos fundos, repassando para o vizinho que passou outra vez para o vizinho seguinte, numa operação de salvamento montada e ensaiada. A corajosa Célia enfrentou a Polícia Federal em nome de sua rádio, de sua gente, dos vizinhos e agregados ao projeto de comunicação popular. Todos foram processados, a Justiça desempenhou seu papel multando pesadamente os responsáveis pela rádio e o silêncio voltou à comunidade, a não ser pelas caixinhas de som nos postes que continuam teimosamente a demonstrar que o povo precisa ter voz.

No programa “Alô comunidade”, que eu apresento todos os sábados na Rádio Tabajara AM e em mais seis rádios comunitárias, dona Célia conta porque passou a amar o projeto de rádio comunitária, fala dos políticos e aproveitadores que rondavam a emissora e que depois da repressão sumiram todos. Um libelo acusatório de quem fala com a voz da razão e do combate solidário. Dona Célia sempre lutou por uma vida mais digna para sua família e para seus vizinhos. Ela conta que os primeiros tempos na comunidade foram difíceis. Porém, sempre houve muita união e solidariedade entre as famílias. “A imprensa só fala mal de nosso bairro, eles têm preconceito, só somos notícia quando acontece um crime”, diz ela. “Mas a união e cooperação nos fez vencer e construir o que temos hoje”, fala orgulhosa. O que ela chama de vencer é ter uma casa para morar e uma família bem encaminhada.

        O meu veemente aplauso a dona Célia, já indicada para receber o Prêmio Leonilla Almeida do Ponto de Cultura Cantiga de Ninar, oferecido às mulheres destemidas e dedicadas ao bem comum.

       Leonilla Almeida foi uma combatente revolucionária, nascida em Itabaiana, presa em 1935 na Ilha Grande, no Rio de Janeiro, juntamente com seu esposo Epiphanio. O casal virou personagem do romance “Memórias do Cárcere”, do escritor alagoano Graciliano Ramos. O prêmio é uma forma de preservar a memória dessa mulher corajosa e sonhadora, que lutou pela igualdade entre as pessoas.

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