sábado, 23 de abril de 2011

Homem não vale nada


                                            Chefe Zulu e suas esposas

Quem quiser se iniciar no conhecimento da moderna literatura africana faça como eu, comece ouvindo as palestras da professora Rosilda Alves, da UEPB, e lendo os autores José Eduardo Agualuza, de Angola, e Paulina Chiziane, de Moçambique, mediadores em suas obras desse encontro cultural entre africanos e brasileiros. É a África portuguesa que não conhecemos.

Na palestra que fez durante o lançamento do meu livro “Biu Pacatuba – um herói do nosso tempo”, em Sapé, contou a professora que faz parte dos seus estudos o livro “As mulheres do meu pai”, de Agualuza, narração da história de Laurentina, cineasta moçambicana que reside há muito tempo em Portugal. Ela descobriu que seu pai era um músico angolano, famoso pelo seu talento e por ter 20 filhos com diversas namoradas e esposas. Laurentina percorreu Angola, Namíbia, África do Sul e Moçambique à procura de suas origens.

O outro livro tem o título de Niketche: uma história de poligamia (2005), de Paulina Chiziane. “Conta a história de Tony, um funcionário da
polícia, e sua mulher Rami, casados há vinte anos. Com a descoberta da poligamia do esposo,  Rami  decide  procurar  as  mulheres  do  marido  em  vários  lugares  de  Moçambique: em Maputo, Inhambane, na Zambúzia, na Nampula e em Cabo Delgado.

“Niketche” é uma das danças do norte de Moçambique, extremo oposto de onde mora  Rami.  Ritual de  amor  e  erotismo,  a  dança  é  desempenhada  pelas  meninas  durante  cerimônias  de  iniciação  sexual.  O romance retrata  a  busca  de  Rami  como  uma  incursão  pelo  desconhecido  e  uma  tentativa  de  lidar  com  a  diferença,  simbolizada  pelas amantes do marido. O objetivo desse trabalho é destacar nos dois romances de que forma ocorre a  (des)construção  do  universo  masculino  e  feminino,  a  visão  destruidora da imagem mitificada do herói, o questionamento quanto às identidades, a
partir das referências identitárias e da sexualidade que enveredam na construção do ser humano.” (Rosilda Alves Bezerra)

A mulher do polígamo encontra uma de suas mulheres. Entre as duas trava-se o diálogo:

-- Você sabia que ele era casado comigo? Por que você ficou com ele, sabendo que tem tantas mulheres?

-- Não vejo nada demais. Até tenho outro amante além do seu marido, que passa muito tempo sem aparecer. Esse outro meu amante é um homem bom, atencioso, sabe tratar uma mulher. Quer experimentar esse meu amante por uma noite?

A mulher ficou horrorizada:

-- Como é que você tem coragem de emprestar seu amante a outra mulher?

-- Minha filha, a gente empresta uma colher de pau, que tem tanta utilidade, quanto mais um homem!

A moça não era possessiva.  Vinha de uma terra onde a solidariedade não tem  fronteiras.  “Sou de um lugar onde se empresta o marido à melhor amiga para fazer um filho, com a mesma facilidade que se empresta uma colher de pau”. (CHIZIANE, 2004, p. 82).

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