Se não tenho certeza, pelo menos uma probabilidade
lógica: lá se vai o homem, imortal no tempo que convencionou e no qual
se ajusta como pode. A criatura primitiva trabalhava com 700 centímetros de caixa
craniana. Hoje, nós modernos acomodamos nosso cérebro em uma caixinha de 1.200
centímetros cúbicos e ainda assim não concebemos o começo, meio e fim. Não sabemos se
fazemos parte de um plano geral arquitetado por um deus ou se somos apenas uma
insignificante granulação de energia.
De qualquer forma somos imortais, com essa dinâmica
toda de saber que vamos morrer. E lá se vai o homem, deixando na lembrança e na
esperança sua perpetuidade.
Heráclito: “você não molhará duas vezes os pés no
mesmo rio.” Eu, que sou avesso às águas turbulentas de qualquer riacho, diria: “você
não molhará os pés nem mesmo uma só vez no mesmo rio.” O fato é que esse ano de
2016 se arroga o direito de ter sido um ano cabra safado acima da média. Para
terminar, meu pai partiu para os contratempos e contraluzes do inexplicável. Eu
fiquei aqui, ainda procurando a estrela inatingível, investindo contra moinhos
e tentando ser útil.
Vou esperar 2017 mangando dessas convenções, mas
fatigado por causa de 2016 e sem querer culpar ninguém porque não fui bem em algumas
provas desse circuito. Azares do jogo. “Julgarás a ti mesmo – disse o Rei ao
Pequeno Príncipe. – É bem mais difícil, mas, se o fizeres bem, então serás
verdadeiramente um sábio.”
No meu julgamento, fui achado culpado por omissões
e algumas ações canalhas. Como pregador da “verdade”, admiti dogmas e quis
empurrar essas minhas crenças nas pessoas, ao mesmo tempo em que falava mal dos
neopentecostais e sua violenta ação midiática e de resultados. Vou em frente,
querendo agir menos calhordamente. Nenhum julgamento é definitivo. Como produto
final de mutações de milhões de séculos, você está sempre em fase de teste.
Nessas microevoluções, você nem nota que amadurece
ou apodrece. Meu único desejo para 2017: que meu cérebro viciado nos mesmos
movimentos racionais não me obrigue a suportar uma sociedade injusta, por achar
inútil protestar. Quero ser co-autor da morte de 2016, um ano calhorda, e, em
última análise, criar 2017 segundo a imagem e semelhança de um macaco em
formação, condicionado por mecanismos bioquímicos, mas com uma ligeira
perspectiva do eterno.
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