Três de ORLANDO TEJO, poeta de Campina Grande
Soneto dos
dedos que falam
Que importa que foguetes cruzem marte
E bombas de hidrogênio acabem tudo,
Se aos meus dedos, teus dedos de veludo
Ensinam que o amor é também arte?
Não desejo mais nada além de amar-te
E em êxtase viver, absorto e mudo,
Sorvendo da ternura o conteúdo
Que antes te buscava em toda parte!
Esses dedos que afago entre meus dedos,
Que acaricio a desvendar segredos
De amor nestes momentos que nos prendem,
Têm qualquer coisa que escraviza e doma,
Porque teus dedos falam num idioma
Que só mesmo meus dedos compreendem!
Conceição
63
Rua da conceição, sessenta e três
(a artéria tem o ar de um cais comprido)
aqui, anos sem fim tenho vivido
buscando a infância azul que se desfez.
Talvez seja isso um sonho, mas talvez
este meu velho abrigo tenha sido
da mesma argila minha construído,
porque é a mesma a nossa palidez!
Ele a mim se assemelha: é ermo e triste.
No jardim, no quintal, no chão, no teto
em tudo a mesma semelhança existe.
No tempo, entanto, aos céleres arrancos,
o seu telhado vai ficando preto
e os meus cabelos vão ficando brancos
Impasse
Se ficar onde estou não faço nada,
Se sair por aí corro perigo,
Se me calo minh’alma é sufocada,
Se disser o que sei faço inimigo...
Se pensar vou trair a madrugada
E se sonho demais vem o castigo,
Se quiser subo até o fim de escada,
Mas precisa brigar, e eu não brigo!
Se cantar atropelo o contracanto,
Se não canto maltrato o coração,
Se me faço sofrer me desencanto,
Se reprimo o ideal perco a razão,
Se perder a razão, resta-me o pranto
E meu pranto não faz uma canção.