As glórias e as
misérias da eleição! Aventurosos, modestos garis, barnabés, taxistas,
bancários, guapas figuras de desocupados em busca de seu momento de fama, de
tudo tem no rol dos candidatos. Meu compadre Mister D, combativo militante das
causas sociais e mais aguerrido ainda ativista do bom copo no bar pé-sujo,
inventou de fazer uma expedição moralizadora ao mundo cão da eleição. Cismou de
se candidatar a vereador. A aventura tinha tudo pra não dar certo: sem grana,
com zero espaço no campo de batalha sem lei que chamam de bases eleitorais, sem
estrutura alguma e com pendências burocráticas a vencer na repartição, o mundo
percebia nitidamente que o futuro candidato ingressaria numa canoa furada,
condenada a naufragar no primeiro balanço da maré eleitoral. Menos ele. O
desastre o chamava com forte apelo. Não resistiu e registrou a candidatura, um
sonho antigo.
Antes, nosso
candidato ao fiasco consultou Xangô, o rei de Iorubá e entendedor das coisinhas
da politicagem. O orixá foi categórico: “meu filho, não se meta em embuança de
eleição. Não endosso seu querer. Sua missão é tocar fogo nos políticos por
ventura encontrados em falta e não fazer parte dessa nação prevaricadora.”
Mister D, desolado, apelou para algo assim como um agrado para ter a benção da
entidade. Prometeu pimenta malagueta para abertura de caminho no lamaçal
eleitoral. Ora, todo mundo sabe que pimenta é a oferenda mais do agrado de
Xangô. As ardidinhas são elementos essenciais para a transmissão do axé. Assim
foi feito. Mister D mandou sua cara metade comprar pimenta malagueta para ter a
insigne honra de fazer do orixá seu mais forte cabo eleitoral. Deu-se, porém,
que foi comprada pimenta errada. O adorador de pimenta revoltou-se contra o
baixo nível de ardência da pimenta biquinho, oferecida equivocadamente. O
Senhor dos trovões e do fogaréu lançou raios de infortúnio diretamente de sua
boca blindada e sua língua preparada por milhões de anos de ardência. Nem com a
desesperante recomendação e juízo de Xangô, o obstinado candidato largou a
vontade de peregrinar pela seara da caça ao voto.
Em conclusão,
Mister D lançou-se à campanha desprevenido de tudo, inclusive das bênçãos dos
orixás. O certo é que seus minguados recursos materiais ficaram no bar, posto
que os eleitores mais próximos eram os comparsas do “pé-sujo”. Baldadamente,
apelou para os povos dos terreiros. Têmpera indomável, o velho Mister D seguiu
até o fim o roteiro de seu desastre. Gastou tudo quanto havia do escasso “fundo
partidário particular”. Devido à forte tempestade alcoólica durante a travessia
da campanha, veio a adoecer, mais pela deslealdade dos falsos eleitores que
prometeram votos, fingimento que o prostrou em profunda depressão pós
eleitoral. O capricho trouxe somente atribulações e amargura.
O fiel Mister D sabe
que continua com a proteção de Xangô, apesar do deslize. “Ninguém derruba um
filho desse orixá. Pode até levar pro buraco, mas a gente volta de peito
aberto, renascendo com mais força”, confessa o candidato batido, cujo orixá não
tolera corrupção nem disputa pelo poder. “Ainda há de ter uma lei eleitoral
decente”, sonha Mister D.
Uma derrota como
essa não se inventa na hora. É fracasso produzido com persistência e decisão.
Da derrota anunciada, ficou uma lição: não seja candidato sem o devido axé e
sem caixa dois. E, importante: previna-se com pimentas de cheiro da melhor
procedência.
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