O poeta cordelista Massilon Silva, de Aracaju, Sergipe, reúne poemas e crônicas
fesceninas com o título “O livro vermelho da putaria”, obra a ser lançada em
outubro. O texto de apresentação fica por conta do
cordelista Fábio Mozart, Presidente da Academia de Cordel do Vale do Paraíba,
de Itabaiana (PB).
Conforme Massilon, o título da obra pretende ser uma paródia do
famosíssimo “Livro Vermelho de Mao”, com citações de reflexões do líder chinês
Mao Tsé-Tung, o segundo livro mais vendido na história, atrás apenas da Bíblia, tendo aproximadamente 900 milhões de cópias impressas. “Meu livrinho não chegará perto disso, mas faz parte da minha revolução
cultural, colocando a obscenidade e o erotismo como arte fora do círculo do
marginal ou proibitivo, contando com artistas fesceninos como o poeta Vavá da
Luz, da Paraíba, um clássico nessa linha temática” comenta o autor.
Fábio Mozart informou que o Livro Vermelho de
Mao teria sido escrito por Hu Qiaomu, ajudante de ordens de Mao por 25 anos. “Muitos anos
depois, ajudantes de ordens também são acusados de outras safadezas, sendo, no entanto,
a obscenidade do livro de Massilon de outra espécie, muito mais decente e
orgiástica”, comentou Mozart. Para ele, a obra de Massilon Silva é irreverente
e burlesca, um tanto simples como é o humor nordestino, ponto basilar na cultura
desta região.
Mozart cumprimenta o poeta Massilon em nome de Antonio
Xexéu, poeta fescenino de Itabaiana. Admirador do grande Manoel Xudu. Xexéu um
dia encontrou-se com Heleno em uma venda, na fazenda Taumatá. Depois de
engolidas algumas lapadas de mel de abelha com cachaça de cabeça, os dois vates
começaram a cantar safadeza, aqueles versos fesceninos, um bocado licenciosos.
Heleno Alexandre é um sujeito erudito, escolado, longe do padrão dos poetas
repentistas analfabetos do Nordeste. Ele faz questão de esclarecer que na Roma
antiga que falava latim, os versos
fesceninos eram populares, porque se acreditava que a obscenidade tinha o poder
de afastar o mau-olhado. Antonio Xexéu é também cantor da trova libidinosa, mas
sem a erudição do companheiro. Afinal, “só terminou a cartilha do ABC e a
tabuada”. Começaram a cantar um “trocado”, quando Heleno falou de suas façanhas
masturbatórias:
Eu trabalho atualmente
Na Fazenda Santa Esther
Meu patrão tem uma mulher
Que é o satanás em gente
Quando ele está ausente
Ela chega no terreiro
Passa a mão no corpo inteiro
Aumentando o meu tesão
Eu vou me acabar na mão
Feito colher de pedreiro.
Xexéu aproveitou a passagem de um casal de caprinos para cantar:
A cabra ensinou ao bode
A demonstrar compostura
Acabar com essa frescura
De comer cu, que não pode!
Eu faço barba e bigode
Disse o bodinho tarado
Já ficando aperreado
Com o cacetinho duro
Encostou no pé do muro
Dizendo: fode ou não fode?
Meu nobre amigo Massilon Silva, vai
aqui este prefácio em forma de notícia para sua poesia de sacanagem,
salientando que o verso fescenino é usado com fidalguia e elevação, sendo que
até poemas religiosos rezam pela oração do erotismo. A alegria, o despudor e o
prazer do desejo estão presentes em Goethe, Baudelaire, Rimbaud, Apollinaire,
Valéry, Kafávis e outros monstros sagrados da “jubilosa transgressão”, no dizer
de Georges Bataille. Recentemente, tive o desprazer de ver folheto do meu amigo
Vavá da Luz ser censurado por uma editora universitária por ser muito
apimentado no tempero de Eros. O meritório e liberal veio poético de Vavá não
obteve o passaporte da cultura oficial. É como se tivessem censurado Gregório
de Mattos, Carlos Drummond de Andrade, Glauco Matoso, Bernardo Guimarães,
Osvald de Andrade e até Olavo Bilac, com aquela cara de Príncipe virgem, mas
praticante também das licenciosidades literárias eróticas-fesceninas. Seu Livro
Vermelho da Putaria vai para um reservado na minha estante onde guardo com
a tradicional e fingida invisibilidade as obras libertinas como “Baú de putaria”,
um livro libertino do casto poeta amigo Rui Vieira, de Campina Grande.
Eu escrevi o cordel “Dicionário Vavá da Luz de
Safadezas e Ideias Afins”, que pretendia ser sarcástico, irreverente, satírico,
burlesco, escabroso e chulo, mas foi humilhado pelo “Livro Proibido de Vavá da
Luz”, outra obra prima safada questionadora dos códigos morais, a que se junta “O
livro vermelho da putaria”, desse grande obsceno e talentoso poeta Massilon Silva,
seguidor de Bocage, o príncipe da literatura fescenina. Como diria Vavá, receba
meu abraço por trás e boa devassidão nos caminhos escandalosos das licenciosidades
literárias.
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