Se eu fosse bom poeta
E soubesse bem glosar
A minha escrita inquieta
Saberia avaliar
Essa criação correta
E bom conceito formar
Choveu chuva de cordel
Na horta de “seu” Mozart
O professor, ator e radialista Bento Júnior não esconde sua devoção intensa pela cultura popular. Chega a entrar em êxtase quando fala, declama e interpreta Ariano Suassuna. Há mais de trinta anos ele manifesta a grandeza do escritor e dramaturgo paraibano. Isso nos palcos e no rádio, no folheto de cordel brasileiro e na academia. O homem tem um grande respeito, quase uma reverência pelo autor do Auto da Compadecida. Aprendeu a imitar a voz de Ariano, sonha com o romancista de Taperoá, tem vez que pensa que é o próprio. Bento celebra o movimento armorial em toda sua vida de artista e professor.
Na qualidade de poeta de cordel brasileiro, como gosta de ser denominado, Bentinho escreve folheto desde a hora em que acorda até quando seu cabeção descansa no travesseiro com fronha de xilogravura. Sua obra é autofinanciada. Na cidade João Pessoa, Bento representa uma espécie de lado B da diversidade cultural, sem muito espaço, mas resistente. Vai buscar inspiração nos poetas do povo para escrever seus folhetos e sair doando a quem estiver disposto a perder cinco minutos para ler suas histórias, onde descarrega seus discursos humanistas e políticos, como um lembrete aos intelectuais para se ligar no verso do povo e nas alternativas culturais e seus discursos que vão de encontro à mídia corporativa e às “igrejinhas”.
Estando o velho Mozart na sua toca, no alto de uma serra nos contrafortes da Borborema, eis que me chega um pacote de folhetos do compadre Bento Júnior, todos trazendo no seu versejar simples a exclusão social, o humor claro e trivial do povão e os temas da atualidade, indo além da opinião ácida com humor de meio de feira. Bentinho fala dele mesmo e de suas relações familiares nos folhetos “Cordel brasileiro”, “O fujão” e “Que menino metido”. As pessoas e bichos que ele admira também ganharam folheto, destacando-se “Zé Calixto, o rei do fole de 8 baixos”, a frevista Fofinha é estrela em “Roteiro de uma loba” e seu cachorro Max mereceu lágrimas de saudades cordelescas em “Meu amigo Max”.
Falando de pandemia, Bento Júnior construiu comigo o folheto a quatro mãos “O poeta que virou zumbi no terror da pandemia”. Depois lançou “O Brasil achou saída?”, “A lendária história da cloroquina”, “A vacina cidadã” e “Vírus no ar”. Nacionalista igual seu ídolo Suassuna, o poeta Bento escreveu com tintas cívicas inquietas o folheto “Brasil, quem te usa não te ama”.
Galhofeiro de corpo e
alma, Bento Júnior gosta de escrever seus folhetos de gracejo. No pacote, veio
“O poeta e o barbeiro”, “O padre cachaceiro”, “As palhaçadas de Mané de Zé de
Candinha”, “Corno Ratinho”, “A peleja entre a Vida e a Morte” e “O casório do
bode”. Com a mesma feição gaiata, em forma de “romance”, Bento compôs “A briga
do homem que dormia nu com o mosquito Perivaldo”, “A briga do leão do circo e o
gato Rouxinol” e “O segredo da moça”, este com 36 páginas. Li tudo. Vou botar
no mostruário e exibir os folhetos de Bento em uma quitanda. Tem um bom fluxo
de turistas por lá. Farei minha parte para a tal democratização cultural.
Lembrando que eu fiquei sabendo da intenção do atual Diretor da Fundação de
Cultura de João Pessoa, Marcos Alves, de dar mais relevância à literatura de
cordel nas políticas públicas da Prefeitura de João Pessoa. Se for bem
sucedido, terá certamente um folheto de Bento elogiando as ações. Frustrando a
galera, merecerá um folheto esculachatório do palhaço poeta.
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