quinta-feira, 7 de maio de 2020

Memorial dos meus amigos



Nessas longas tardes, noites e manhãs de apartação social, tenho pensando nos amigos e amigas que passaram pela minha vida, alguns que já morreram e que são mais do que números, outras e outros ainda presentes iluminando minha vivência com poesia, afeto, fraternidade, companheirismo, ensinamento e boas lembranças.

Hoje vi um portal chamado “Inumeráveis”, memorial dedicado a cada uma das vítimas do coronavírus no Brasil que já passam de oito mil pessoas. A ideia é registrar em poucas linhas a personalidade das vítimas da doença a partir de depoimentos das famílias, para que deixem de ser apenas números na estatística dessa tragédia. (www.inumeráveis.com.br) Definições do tipo “Adalberto, o carnaval em pessoa; Adélia generosa; Adriana dentista, criadora de sorrisos”; Afrodísia, matriarca amorosa; Aldevan, um bravo doce...”; Alexandra Popoff, imigrante russa que fazia a melhor bacalhoada; Ana que amou a vida; Anisio que amava rock and roll; Arthur Martins que foi ao encontro do seu cão amado; Augusto Octávio, o palhaço da família; Bernadete, tia Bebé tão generosa; Carlilo, seu sonho era voltar a andar; Cícero Romão, enfermeiro que cuidou de todos até seus últimos dias”, e vai por aí.

Pois eu gastei o juízo um pouquinho e fiz micro biografias de algumas pessoas do meu círculo de amizade. Nunca, entretanto, pensando em que venham a constar desse memorial das vítimas do coronavírus, mas só para exercitar minha destreza no laconismo e reafirmar a simpatia e apreço que sempre tive e terei por essas pessoas. Certos nomes ficaram de fora. Alguns porque não toleram publicidade, outros porque são tão essenciais na minha história de vida que a redundância chega a ser chocante. Meu pai, por exemplo, o que diria dele em dez palavras? “Foi quem me deu a primeira papa, o primeiro livro e o primeiro elogio”.

Da lista já constam mais de cem nomes, pela ordem alfabética. Daqui para o final do isolamento terei uns trezentos micro perfis. Eis os primeiros do inventário da dileção:

Adeildo Vieira
Cantador das benquerenças e um coração enorme.

Adiel
Meu primeiro patrão. Fui ajudante de aguadeiro, tangedor de burros do meu primo.

Agnaldo Barbosa
Ardiloso criador de estórias e um herói do populário.

Adilson Adalberto
Um biólogo que quis ser poeta e vive seu sonho.

Alves
Meu compadre maquinista de gigante simpatia e trovador das estradas de ferro.

Alcion
Morreu datilografando carta para a namorada. Primo e amigo de infância.

Albenor
Cândido menino comunista oitentão.

Almiro
O mestre do babau, o ator popular, o cantor de rua, um artista singular na sua simplicidade.

Aline
Primeira namoradinha, aos dez anos. Cachinho, ternura e meiguice em retrato desbotado na memória.

Aniceto
Vizinho decente e discreto.


Antonio de Pádua El Gorrión

Professor que fez da escola um lugar de interlocução e vivência, com seus folhetos e a força da simpatia.

Assis Firmino
Meu compadre é como bolacha: em todo canto se acha. Pitoresco filho de Mari.

Avelino
Mistura da bonomia do Sargento Garcia com a valentia do Zorro. Sargento Avelino, de quem fui escrivão improvisado, professor de português e admirador.

Arnaud Costa
“Foi quem me deu a primeira papa, o primeiro livro e o primeiro elogio”.


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