quarta-feira, 25 de agosto de 2010
Poesia na rodoviária
Quando entrou na casa dos setenta, Agenor Otávio descobriu que era poeta. No curso dos últimos cinco anos não parou de encher cadernos com seus poemas simples, falando de sua terra e sua gente. A experiência criativa de Agenor Otávio fez dele um homem novo. Sua arte, entretanto, pedia urgência para ser divulgada. Como é insaciável e abrasivo o vício de escrever, já notava o colombiano Gabriel Garcia Marques.
Começou no grupo de amigos, distribuindo cópias de seus versinhos. Depois passou a andar com um feixe de papel com as últimas carreiras de poemas. Nas reuniões sociais, na repartição, na rua, onde encontrasse quem parecesse digno de ler um poema, era imediatamente mimoseado com uma quadrinha de Agenor.
Depois descobriu a internet e fez logo seu blog. Seu caderno de anotações virou arquivo eletrônico. Agenor imortaliza heróis e artistas de sua terra pela mágica da poesia. Sua aventura fascinante pelo mundo das rimas e métricas, nem sempre perfeitas, deu fôlego para dois livrinhos, que ele vende de porta em porta. É o único poeta que conheço a oferecer poesia a domicílio. O prazer de escrever é o mais íntimo e solitário que se possa imaginar, e a satisfação de ver que alguém lê o que se escreve é maior ainda. Agenor está convencido de que Deus lhe deu o dom de poetar, embora tardio, e precisa ter quem leia seus trabalhos. Por isso sai todos os dias oferecendo seus livros.
Agora descobriu uma nova tática para divulgar seu trabalho. Mandou escrever em letra caprichada alguns versos e afixou no guichê da parada de ônibus que alguns chamam de rodoviária. Toda manhã, chega cedinho para observar os primeiros passageiros que compram passagens. Fica de longe, impondo-se à tarefa de conferir quem lê as quadrinhas, como uma espécie de disciplina para manter a vontade de continuar escrevendo, “que o tempo voa e daqui a pouco chegam os oitenta”.
O poeta Agenor Otávio parece tomar fôlego para uma longa vida. Dá graças a Deus e à poesia. De maneira que o transcurso dos anos passa sem achaques para o poeta, porque o exercício da criação literária, ou outra arte qualquer, “é o estado humano que mais se parece à levitação”.
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