domingo, 13 de setembro de 2009

Dr. Dedé e o soneto encantado


Poeta Raul de Leoni

O jornal “Itabaiana Hoje”, do meu confrade Geraldo Almeida de Aguiar, publicou uma carta aberta de José Barbosa de Lucena, o conhecidíssimo doutor Dedé, dirigida ao meu pai Arnaud Costa. Na epístola, Dedé pede ao culto Arnaud Costa que o ajude a encontrar um poema perdido na memória, quando ele estudava na escola da também famosíssima professora dona Marieta Medeiros. Um livro didático adotado na época apresentava um soneto com o qual Dedé se identificou de imediato. Decorou a composição poética e vivia declamando para si mesmo. “Era como se existisse um tropismo ancestral para gostar daquela poesia, como se uma força superior, semelhante à que guia as tartarugas para desovar sempre nas praias onde nasceram, me fizesse sempre lembrar da poesia”, escreveu Dedé.

Meninote com seus oito ou nove anos quando tomou conhecimento do poema, Dedé passou a infância e adolescência recitando-o ou fazendo uma leitura mental antes de dormir. Mas o tempo encarregou-se de limpar da sua memória o soneto tão amado. Ficaram apenas três estrofes:

E a Vida passa... efêmera e vazia:
Um adiamento eterno que se espera,
Numa eterna esperança que se adia.

O nosso estimado médico passou mais de 30 anos procurando em vão os versos que faltam para recompor a “poesia símbolo” de sua infância. Lembrar do soneto na íntegra passou a ser uma obsessão. Andou por muitos sebos, consultou literatos, e nada! A poesia simplesmente desapareceu, deixando seu mais fervoroso leitor na dúvida: será que essa poesia nunca existiu, foi apenas fruto da imaginação de criança?

A esperança é o melhor dos médicos, já dizia o provérbio. Ao médico Dr. Dedé, tenho o prazer de anunciar que descobri o texto completo do seu amado poema, escrito por Raul de Leoni, poeta que morreu há mais de oitenta anos e ainda hoje é venerado por seus inúmeros leitores, a exemplo do nosso esculápio. Nasceu em Petrópolis em 1895 e faleceu em 1926. Foi diplomata e deputado. Morreu de tuberculose, uma doença comum aos poetas da época.

Ao insigne editor Geraldo Aguiar, peço encarecidamente que leve ao conhecimento do nosso Dr. Dedé o teor do seu querido soneto.

LEGENDA DOS DIAS

O Homem desperta e sai cada alvorada
Para o acaso das cousas... e, à saída,
Leva uma crença vaga, indefinida,
De achar o Ideal nalguma encruzilhada...
As horas morrem sobre as horas... Nada!

E ao Poente, o Homem, com a sombra recolhida,
Volta, pensando: «Se o Ideal da Vida
Não veio hoje, virá na outra jornada...

Ontem, hoje, amanhã, depois e, assim,
Mais ele avança, mais distante é o fim,
Mais se afasta o horizonte pela esfera;

E a Vida passa... efémera e vazia:
Um adiamento eterno que se espera,
Numa eterna esperança que se adia.


Raul de Leoni

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