terça-feira, 16 de outubro de 2012

COLUNA DE ADEILDO VIEIRA



O que é que o Baiano tem?
Trombone de ouro, tem...

Adeildo Vieira

No Bar do Baiano cabem várias Bahias. Primeiro é preciso entender quantos universos existem no coração do boêmio, quantas senzalas e quantos palácios se juntam pra fazer festa nas ebriosas noites intermináveis, quantas casas grandes e quanto cabarés habitam as mesas onde copos não param cheios e corações vazios se completam até afogar suas dores com goles e goles de bar tomados no gargalo da madrugada. Entendido isso, ainda carecemos de definição para o Bar do Baiano. É que estamos falando de empresa cujo capital são seus clientes e sua renitente sede de poesia boêmia. 

Há quase dez anos morria o Baiano subitamente, numa segunda-feira em que o dia transformou-se em madrugada sem estrelas. Partia o fundador da confraria dos poetas das noites sem fim e ficava a poesia, matéria-prima suficiente pra manter a vida latejando suas dores e celebrando seus amores. E foi justamente a poesia que manteve o lume que despretensiosamente o Baiano acendera. Músicos, poetas, cantores e outros desesperados atiçaram no emblemático bar sucessivos carnavais e outras tantas festas cotidianas, fruto do frenesi dos corações dos seus fiéis frequentadores. Ainda que não muito assíduo, procuro me fazer presente, levando meu quinhão de agonia, meu tantão de alegria e uma sede de vida e cerveja (às vezes cuba libre, socializando meu desejo de noite).

Numa sexta-feira dessas eu saía de casa pra cantar duas canções de Adelino Moreira lá no Baiano. Ansioso pra consumar essa aventura, cheguei até a aproveitar o eco do banheiro do meu apartamento para numerosos ensaios. É que o músico acompanhante da noite era nada menos que Elpídio Ferreira empunhando seu violão de setenta vezes sete cordas. Depois de duas cubas libertinas ganhava eu coragem para atirar minha voz no sagrado espaço profano da Bahia de todos os cantos. Parece que deu certo, pois os amigos mais generosos aplaudiram. Os mais exigentes também...

Mas o melhor da noite estava por acontecer. De repente, Salvador di Alcântara, o compositor dos hinos baianescos plugava seu bandolim e passava a acompanhar o nosso Elpídio em músicas instrumentais. Não resistindo ao choro, nosso amigo Azeitona corria pra pegar seu trombone. E foi aí que o choro deu gargalhadas. O trombone é um cantor boêmio, cuja voz atende aos deslizes do coração instalado nos braços de quem o rege. Vai da gargalhada ao gemido com a mesma grandeza. Em todas as situações me arranca lágrimas, sobretudo quando bolinado por aquele músico que tão bem entende dos Radegundis e dos Sandovais. Naquela noite Azeitona espremeu meu coração, me fazendo verter uma lágrima extra virgem, temperando a poesia que a noite nos servia.

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