Ano que vem comemoro quarenta anos da primeira edição do Jornal Alvorada, em Itabaiana. Foi em setembro de 1970 que circulou o primeiro número deste “órgão literário e noticioso”, a concretização do meu sonho de infância. Meu irmão mais velho, Sósthenes Costa, trabalhou como recenseador no censo rural e urbano realizado naquele ano. Na qualidade de ajudante, recebi ao final dos trabalhos, a título de gratificação, a importância de cem cruzeiros, dinheiro que investi totalmente na impressão dos quinhentos exemplares do jornal, cuja edição encalhou quase que totalmente. O jornaleco foi impresso na gráfica d’A FOLHA, do tipógrafo Nabor Nunes de Oliveira.
Reproduzo abaixo matéria do meu compadre Sanderli Silva, um dos elementos responsáveis pelo jornal Alvorada, publicada no mesmo pasquim de dezembro de 1995:
“Fui um dos colaboradores do jornal, que nasceu junto com a Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz, no ano de 1970. Lembro que, na época, só Fábio Mozart tinha alguma noção de jornalismo, já que filho de tipógrafo. Como em todas as coisas idealizadas na mocidade, havia aquele toque de fantasia. No decorrer de 25 anos e em edições esporádicas, o Jornal Alvorada incomodou os “donos do poder” em plena ditadura, o que nos valeu prisões e outras retaliações. Quando pensavam que o jornal estava morto, lá vinha ele mimeografado, baixando a lenha nos salafrários de toda ordem.
Severino Araújo Biel, um dos redatores do Alvorada na década de 80, escreveu em março daquele ano: ‘No passado fomos réus, fomos vítimas de um tempo ruim que nossa geração não pode esquecer. Hoje queremos ser apenas escrivãos do povo na sua capacidade de converter em realidade os sonhos mais delirantes’.
Fazíamos um jornalismo crítico, um teatro conscientizador e uma poesia antiditatorial. E isso tinha conseqüência. Em 1978, todo mundo foi em cana por causa de um artigo considerado difamatório à ‘pátria’. Naquele tempo de autoritarismo, quem fizesse oposição ao governo era considerado comunista. O delegado de Itabaiana era protestante, o Major Sá, que mandou a gente ler a Bíblia ‘pra aprender a respeitar as autoridades’. Fábio Mozart, ateu convicto, foi obrigado a ler todo o livro do Apocalipse.
O chefe político da cidade, Dr. Antonio Santiago, comprou toda a edição do Alvorada em abril de 1977, por causa de um artigo ofensivo ao ‘coronel’. O garoto que vendia o jornal, inocentemente vendeu todos os exemplares e a edição desapareceu no silêncio misterioso da mediocridade provinciana, reaparecendo nas mãos de um capitão do Exército que nos chamou no 15º Regimento de Infantaria, em João Pessoa, para explicar ‘aquele boletim comunista feito por pobres diabos guiados por Moscou’.
Nesses anos todos, muitos colaboraram com o Jornal Alvorada. Perdemos na memória alguns nomes. Lembro, entretanto, do Zé Ramos (vereador do antigo MDB), Enock de Macena, Sósthenes Costa, Joacir Avelino (atualmente delegado da Polícia Federal, fundador do PT em Itabaiana), Osório Cândido, Beto Palhano, Antonio de Pádua, Pedro Lourenço, Arnaldo Barbalho, já falecido, Aguinaldo Alves, Norberto Araújo, Marcos Veloso, Zenito Oliveira, Mira Palhano, Irene Marinheiro e Fábio Mozart, que foi diretor, redator, gerente, gazeteiro e tipógrafo ocasional.
Em 1984, a Prefeitura de Itabaiana emprestou à Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz uma máquina impressora manual super antiga. A gente costumava dizer que a notícia do descobrimento do Brasl foi impressa naquela máquina. Instalamos a gráfica supapo numa casa coberta de palha caindo aos pedaços, no bairro proletário do Açude das Pedras. Com peças improvisadas, refizemos a velha impressora e assim saiu a primeira e única edição em ‘oficinas próprias’, como orgulhosamente anunciava o cabeçalho. Guardei o exemplar mal feito porque tinha consciência do seu valor histórico. Acho que fomos os únicos jornalistas do mundo a redigir diretamente no componitor, por não dispor de tipos suficientes nas caixetas das fontes. A matéria dependia da disponibilidade dos tipos móveis.
Em setembro de 1979, o Alvorada publicou a foto das paredes da redação pichadas com frases ofensivas. O editorial dizia: ‘a extrema direita resolve pichar um jornal liberal como o Alvorada, e escala para esse trabalho sujo seus elementos mais analfabetos. Escreveram cafajeste com G. Só que, para tristeza dos nossos inimigos, somos como o riacho descendo a serra: apesar das quedas, não abandonamos o caminho’. Assim esse jornaleco matuto sempre foi fiel ao seu lema: ‘É necessário uma posição de coragem, e não de dependência, aos poderosos do dia’.”
Reproduzo abaixo matéria do meu compadre Sanderli Silva, um dos elementos responsáveis pelo jornal Alvorada, publicada no mesmo pasquim de dezembro de 1995:
“Fui um dos colaboradores do jornal, que nasceu junto com a Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz, no ano de 1970. Lembro que, na época, só Fábio Mozart tinha alguma noção de jornalismo, já que filho de tipógrafo. Como em todas as coisas idealizadas na mocidade, havia aquele toque de fantasia. No decorrer de 25 anos e em edições esporádicas, o Jornal Alvorada incomodou os “donos do poder” em plena ditadura, o que nos valeu prisões e outras retaliações. Quando pensavam que o jornal estava morto, lá vinha ele mimeografado, baixando a lenha nos salafrários de toda ordem.
Severino Araújo Biel, um dos redatores do Alvorada na década de 80, escreveu em março daquele ano: ‘No passado fomos réus, fomos vítimas de um tempo ruim que nossa geração não pode esquecer. Hoje queremos ser apenas escrivãos do povo na sua capacidade de converter em realidade os sonhos mais delirantes’.
Fazíamos um jornalismo crítico, um teatro conscientizador e uma poesia antiditatorial. E isso tinha conseqüência. Em 1978, todo mundo foi em cana por causa de um artigo considerado difamatório à ‘pátria’. Naquele tempo de autoritarismo, quem fizesse oposição ao governo era considerado comunista. O delegado de Itabaiana era protestante, o Major Sá, que mandou a gente ler a Bíblia ‘pra aprender a respeitar as autoridades’. Fábio Mozart, ateu convicto, foi obrigado a ler todo o livro do Apocalipse.
O chefe político da cidade, Dr. Antonio Santiago, comprou toda a edição do Alvorada em abril de 1977, por causa de um artigo ofensivo ao ‘coronel’. O garoto que vendia o jornal, inocentemente vendeu todos os exemplares e a edição desapareceu no silêncio misterioso da mediocridade provinciana, reaparecendo nas mãos de um capitão do Exército que nos chamou no 15º Regimento de Infantaria, em João Pessoa, para explicar ‘aquele boletim comunista feito por pobres diabos guiados por Moscou’.
Nesses anos todos, muitos colaboraram com o Jornal Alvorada. Perdemos na memória alguns nomes. Lembro, entretanto, do Zé Ramos (vereador do antigo MDB), Enock de Macena, Sósthenes Costa, Joacir Avelino (atualmente delegado da Polícia Federal, fundador do PT em Itabaiana), Osório Cândido, Beto Palhano, Antonio de Pádua, Pedro Lourenço, Arnaldo Barbalho, já falecido, Aguinaldo Alves, Norberto Araújo, Marcos Veloso, Zenito Oliveira, Mira Palhano, Irene Marinheiro e Fábio Mozart, que foi diretor, redator, gerente, gazeteiro e tipógrafo ocasional.
Em 1984, a Prefeitura de Itabaiana emprestou à Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz uma máquina impressora manual super antiga. A gente costumava dizer que a notícia do descobrimento do Brasl foi impressa naquela máquina. Instalamos a gráfica supapo numa casa coberta de palha caindo aos pedaços, no bairro proletário do Açude das Pedras. Com peças improvisadas, refizemos a velha impressora e assim saiu a primeira e única edição em ‘oficinas próprias’, como orgulhosamente anunciava o cabeçalho. Guardei o exemplar mal feito porque tinha consciência do seu valor histórico. Acho que fomos os únicos jornalistas do mundo a redigir diretamente no componitor, por não dispor de tipos suficientes nas caixetas das fontes. A matéria dependia da disponibilidade dos tipos móveis.
Em setembro de 1979, o Alvorada publicou a foto das paredes da redação pichadas com frases ofensivas. O editorial dizia: ‘a extrema direita resolve pichar um jornal liberal como o Alvorada, e escala para esse trabalho sujo seus elementos mais analfabetos. Escreveram cafajeste com G. Só que, para tristeza dos nossos inimigos, somos como o riacho descendo a serra: apesar das quedas, não abandonamos o caminho’. Assim esse jornaleco matuto sempre foi fiel ao seu lema: ‘É necessário uma posição de coragem, e não de dependência, aos poderosos do dia’.”
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