terça-feira, 11 de junho de 2013

Para o povão, o maior artista de Pilar é Manoel Xudu



Manoel Xudu

Pilar, terra do imortal romancista José Lins do Rego, é uma cidade antiga cuja cultura está impregnada dos valores das senzalas e casas grandes dos engenhos de açúcar.  Ainda hoje, os pilarenses ou são usineiros ou cambiteiros, e procedem como tal. Sua cultura é a dos canaviais, dos terreiros das usinas. Oligarquias continuam mandando no pedaço.
Vladimir Carvalho foi filmar seu documentário sobre José Lins do Rego em Pilar, perguntou a um aluno da escola que leva o nome do pilarense ilustre: “quem foi Zé Lins?”. O aluno não sabia. 

Do profundo interesse de Vladimir pelo escritor de Pilar, saiu o documentário “O Engenho de Zé Lins”, que reconstitui a vida e a personalidade do escritor paraibano. O filme refaz de maneira apaixonada e original a trajetória do autor de Fogo Morto e Menino de Engenho. Foi no rio Paraíba que o menino Zé Lins pegou esquistossomose, que o fez sofrer pela vida inteira. Na beira desse rio, nasceu Xorró, que foi cambiteiro, tangerino e moleque de engenho no mesmo “Corredor” onde nasceu Zé Lins. Xorró é uma pessoa característica do painel da trajetória humana no universo de José Lins do Rego. Irreverente, inteligente, Xorró seria o bobo da corte naqueles mundos do mandonismo coronelesco de Papa Rabo e outros coronéis. Humorista nato, Xorró conta mil causos que arrancam gostosas gargalhadas dos seus conterrâneos. 

Levei Xorró para meu programa de rádio na Tabajara, que nossa filosofia é dar voz a quem não tem cartaz na grande mídia. Enquanto a programação oficial celebrava mais uma Semana de José Lins do Rego com seus sábios, mestres e intelectuais, lá em Pilar a cirandeira  Odete não tomou conhecimento da festa. Xorró sim, sabia que estavam batendo bombo para incensar Zé Lins, mas ele mesmo não bateu a passarinha, como se diz por lá. 

Daí eu perguntei a Xorró: “pra você, quais os maiores artistas de Pilar?” E ele, na bucha: “Em Pilar, artista mesmo é Manoel Xudu, cantador de viola que não deu outro na ribeira, e meu amigo Antonio Costta, um cabra que veio do sítio Chão de Areia onde vivia tangendo boi com seu pai, e escreveu até um livro que botou meu nome. Eu fiquei muito agradecido a Antonio pelo livro, guardei com muito cuidado, mesmo sem ler, porque nunca aprendi”. 

Confesso com total franqueza que não acredito na redenção de Pilar pela via do turismo cultural em torno do nome do escritor famoso. As pessoas em Pilar não foram educadas para reverenciar escritores, porque a maioria não sabe ler e a obra de José Lins, embora fale daquele universo, não atinge o inconsciente coletivo como, por exemplo, o poeta repentista Manoel Xudu. Esse artista nunca escreveu nada, mas seus versos ainda hoje, muitos anos depois de sua morte, sobrevivem na memória de analfabetos como Xorró. 

A família de Zé Lins andou investindo na restauração do antigo Engenho Corredor, que estava sendo ocupado por famílias de sem-terra. Bem característico da região que o latifúndio sempre expulse o povo para dar lugar à exposição dos seus privilégios de classe mal dirigente.

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