quinta-feira, 18 de junho de 2015

Viva o mamulengo nordestino!

Mestre Miro com seus bonecos originais

Quando era menino, vi um mamulengo, que se chamava babau, na rua das Flores em Itabaiana. Encantado, eu disse a mim mesmo: um dia eu ainda vou brincar com esses bonecos danados. Deu-se que o acaso me levou a conhecer e me tornar companheiro de trabalho do mestre que me enfeitiçava com sua marieta, rosinha, joão redondo, boi, cobra, diabo, padre e benedito feitos de pau de mulungu. Cheguei a brincar na sua tolda, mexi na sua mala de bonecos, toquei pandeiro na sua “orquestra” do babau do Chico do Doce.

Quando Chico morreu, levou com ele sua mala, suas histórias e sua arte que ficou esquecida. Em Mari, conheci outro mestre, o Miro do Babau. “Ninguém quer saber mais disso não”, diz mestre Miro, com seu paletó espalhafatoso e suas cantigas de brega. Seus bonecos bem manipulados já sentem o cansaço da mão do artista cheia de artrite. Terá o mesmo destino de Chico do Doce: vai morrer pobre e esquecido, igual ao mestre Antonio do Babau, ícone da brincadeira na Paraíba, filho de Mari.

Esses mestres estão sendo reconhecidos agora. Em breve, diz que vai sair um edital do Ministério da Cultura para dar dinheiro para mestres com mais de sessenta anos, muitos deles vivendo em situação de miséria no interior do Nordeste. O melhor é que, depois de oito anos de burocracia, o mamulengo passou a ter o título de patrimônio imaterial do Brasil.

Estamos tentando montar uma peça de teatro intitulada “Mari, Araçá e outras árvores do paraíso”, contando a história daquela pequena cidade paraibana. Na peça, fazemos uma homenagem ao mestre Miro e Mestre Antonio do Babau. Os protótipos dos bonecos já estão quase prontos. Uma tentativa de levar às novas gerações essa arte popular que, como tantas outras, é considerada medíocre, coisa de gente analfabeta no mundo do capitalismo e da cultura de massa que marginaliza as expressões artísticas de raiz. Esses grandes espetáculos de mamulengo, eruditos, são frutos do babau, apresentam os mesmos elementos do joão-redondo tradicional, seu humor e despojamento.

E viva o Babau nordestino! 

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