segunda-feira, 14 de novembro de 2016

A falta que ele faz


O maluco beleza Raul Seixas andava perdido pelos Estados Unidos quando conheceu John Lennon, o astro do The Beatles, e sua mulher Yoko Ono. Em 1989, no programa do Jô Soares, Raul falou pela última vez na televisão. O desaparecimento de Raul Seixas foi o fim, de certa maneira, de um jeito distinto de se fazer rock no Brasil e de se viver a filosofia desse estilo musical que surgiu nos Estados Unidos em 1940. “O rock and roll morreu em 1959. Minha música é classificada por mim como raulseixismo e eu tou botando água na fervura da panela do diabo pela última vez”, disse, já meio destrambelhado pelo álcool e outras drogas, o cantor e compositor que marcou época, considerado pai do rock brasileiro.

Acompanhado pela banda “Envergadura moral” e reinventado pelo baiano e amigo Marcelo Nova, Raul cumpria a duras penas seus últimos shows, até morrer em agosto daquele 1989. Na entrevista histórica, Raul contou sobre seu contato com Lennon. “Ele me perguntou qual o nome de maior destaque no Brasil, Eu, meio sem saber o que responder, tasquei: Café Filho”. Esse Café foi o cara que substitui Getúlio Vargas por 14 meses quando o “pai dos pobres” deu um tiro na cara. Em 1955, no ano em que nasci, Café Filho não aguentou a pressão e se mandou. Foi substituído por Carlos Luz, então Presidente da Câmara. O General Lott botou pra fora o Luz e indicou Nereu Ramos, vice-presidente do Senado, para tomar conta da Presidência deste país esculhambado e ditatorial.

Não sei se Raul lembrou do Café Filho por pura galhofa ou porque admirava aquele político insignificante e fraco. O que sei é que hoje eu vejo companheiros como o ex-marxista Dalmo da Silva se posicionar a favor de Michel Temer e artistas do naipe de Vital Farias louvarem o golpista e execrarem a galera da esquerda que foi apeada do poder pelo golpe político judicial.

Raul é citado como um dos cem maiores artistas da música brasileira. Foi expulso do país pelos militares por não se enquadrar na ordem “moral e cívica” dos fardados. O vigor musical do maluco beleza continua até hoje. Suas ideias, com o tempo, mostraram-se na linha dos 80% de bobagens metidas a metafísicas e filosóficas. O resto é rock com aquele toque existencial e muita originalidade. Seu LP Krig-ha Bandolo!, de 1973, ainda hoje é considerado um dos cem maiores discos da musicografia tupiniquim.

Hoje, faz falta o pensamento metamorfoseado desse baiano encapetado. O que diria do golpe que derrubou a Presidenta Dilma? Como se posicionaria diante do lixo musical que se produz hoje? Eu, particularmente, gosto de sua pegada anarquista. “Todos os partidos são variantes do absolutismo. Não fundaremos mais partidos; o Estado é o seu estado de espírito”, afirmou um dia. “Ninguém tem o direito de me julgar a não ser eu mesmo. Eu me pertenço e de mim faço o que bem entender”. Não julguemos Raul. Louvemos sua arte que é sua identidade. “A desobediência é uma virtude necessária à criatividade”, assegurava.

(Para o poeta Paulo Seixas, raulseixista de Queimadas, na Paraíba)



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