sábado, 29 de dezembro de 2012

RETROSPECTIVA 2012 (Aconteceu em Cajazeiras)




Demora, mas chega o tempo em que a gente vê que existem coisas sem nenhuma importância pelas quais a gente briga, esforço sem valia e, principalmente, a grande verdade: tudo o que fazemos é tão somente com o objetivo de agradar ao nosso ego, por mais altruísta que possa parecer qualquer ação nessa vida velha ingrata.

Faça uma retrospectiva do ano e verá que tudo o que relacionar é fundamentado no prazer ou na dor que lhe causou.

Na verdade, não quero fazer retrospectiva nenhuma, que odeio esse negócio. Vou contar uma história que me contaram. Nada a ver. Foi na bela cidade de Cajazeiras, onde reinava uma juíza muito atenta à dignidade da Justiça. O réu era um rapaz que trabalhava na agência local do Correio. Aliás, nem era réu, apenas uma testemunha chave de crime. O fato delituoso: alma sebosa estava postando no Correio cartas anônimas falando mal de pessoas de alto coturno na cidade, incluindo a dita cuja juíza. A Meritíssima pediu, aliás, pediu não, exigiu do agente do Correio a descrição da pessoa que postou as tais cartas anônimas. Ele fez ver que seria impossível lembrar do rosto do remetente das cartas malditas, porque já havia se passado algum tempo e ele não guardava as feições de todas as pessoas que postavam correspondência.

Do alto de sua ira e seu poder, a juíza sentenciou:

--- Pois vai ficar preso por cinco dias para refrescar a memória.

Seguiram-se as providências de praxe: o rapaz foi algemado e preso. A cidade toda ficou revoltada. Contratado um advogado, o causídico requereu habeas corpus e a prisão do carteiro foi revogada. “Entra com uma representação contra essa juíza, rapaz!”, disse o advogado. Seguindo o conselho, o oficial das cartas e telegramas queixou-se ao Tribunal de Justiça, alegando abuso de autoridade por parte da Meritíssima. “Procurar justiça na Justiça é assim como procurar cabelo em ovo de páscoa”, disse outro cajazeirense.

Deu-se o imprevisto: o Tribunal aceitou a queixa e notificou a juíza incomodada com a espionagem da vida privada, comum no interior. Dona “Data Vênia” apelou então para o Superior Tribunal de Justiça, mesmo aceitando o fato de que errou ao mandar prender o rapaz do Correio. É que nos tribunais não se aprende a pedir desculpas.

Aí, deu-se o previsto: o Superior Tribunal, cheio de espírito de corpo e dentro das conformidades dos espíritos de porco, deu ganho de causa à dona “Data Vênia” e fez mais: indicou-a para fazer parte da Corregedoria da Corte Suprema, ou coisa parecida.

A juíza arrumou as malas e foi embora para Brasília, desfrutar do seu novo cargo. Ao passar na praça, a conversa dos desocupados foi diminuindo, foi diminuindo e depois que a mulher passou ficou tudo calado, pensando besteira.

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