sábado, 6 de março de 2021

Minha reverência ao mestre Rivaldo Bandeira

 

Rivaldo Bandeira (à direita) com seu irmão Zequinha Bandeira (Foto: Sto. Barroso) 


Os tipógrafos eram trabalhadores letrados, e por isso politizados, numa época em que o acesso a informações não chegava para a imensa maioria do povo. A primeira greve de trabalhadores no Brasil foi da categoria dos tipógrafos, no início de 1858. Eles reivindicavam aumento de um mil-réis por dia e paralisaram os jornais cariocas. Sob a influência das ideias anarquistas e socialistas, a classe dos tipógrafos se considerava como uma espécie de aristocracia operária.

A greve dos tipógrafos, no final do século dezenove, teve como consequência a demissão dos grevistas. Eles fundaram uma associação e passaram a publicar seu próprio semanário, o Jornal dos Tipógrafos, primeiro jornal alternativo do Brasil. Lembro desse episódio histórico para celebrar os cinquenta anos do meu Jornal Alvorada, editado na cidade de Itabaiana do Norte, na gráfica do mestre Rivaldo Bandeira.

Meu pai foi compositor na tipografia de Nabor Nunes Machado, em Itabaiana. Era muito amigo do outro tipógrafo, Rivaldo Bandeira. Devido a alguns ranços políticos, ele não aprovou minha ideia de editar um jornal. Recorri à tipografia concorrente. O mestre Rivaldo Bandeira acolheu meu projeto adolescente e ainda me ensinou a arte da tipografia. Fui iniciado como impressor de manual, chapista e cortador. Nos anos seguintes, quase virei gráfico de offset, mas acabei caindo na estrada de ferro. Fui ganhar a vida correndo atrás de trem.

O corpo gráfico da tipografia de Rivaldo Bandeira era constituído dele mesmo e do Ronaldo Brão, popular Sabugo. Ronaldo Brão passou toda a vida trabalhando na oficina de Rivaldo, até a morte deste. Quando o mestre Rivaldo desencarnou, deixou em testamento a gráfica para seu devotado e constante colaborador.

Por meio de amigos em comum, entrei em contato no Facebook com a doutora Eliane Pessoa Bandeira, filha do mestre Rivaldo. Morando atualmente em Crateús, no Ceará, Dra. Eliane se diz colecionadora de memórias de sua terra e estimou saber que sou filho de um amigo do seu pai. “Rivaldo Bandeira era um humanista e democrata, dono de uma cultura muito acima de sua escolaridade. Sem ser pedante, entendia de tudo. Conhecia o mundo sem jamais ter se ausentado de Itabaiana. Era simpático aos conceitos comunistas, tinha ideário de igualdade”, recorda Eliane.

Quando o corpo de Rivaldo Bandeira foi velado, seu gato Mimi permaneceu durante todo tempo ao lado do caixão. Acompanhou o cortejo até o cemitério e nunca mais voltou para casa.

Este relato sobre um homem de bem que passou a vida compondo, paginando e imprimindo a crônica do melhor que temos em termos de dignidade e racionalidade humana, vai dedicado aos profissionais técnicos em processos gráficos, reportando a figura de Cassiano Hipólito Ribeiro dos Santos, um dos primeiros operários gráficos deste jornal A União, único jornal oficial ainda existente no Brasil, conforme notifica a Wikipédia. Quando for erigido o museu da imprensa paraibana, é de justiça que os nomes dos mestres Cassiano e Rivaldo Bandeira venham a constituir esse acervo, com a distinção que merecem.

 

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