quarta-feira, 3 de outubro de 2012

COLUNA DE ADEILDO VIEIRA



Pra matar Zeus de inveja

                                                         Adeildo Vieira




É grande a subida ao Olimpo. É grande, mas muitos arriscam a escalada. Se aventuram, pois não se conformam com a condição de reles mortal, desejando o posto de semideus ou até mesmo disputando o trono de Zeus. Este é o projeto de muitos artistas que almejam a fama com o exclusivo intuito de abandonar o mundo terreno para habitar o pedestal do mito, onde será alvo de idolatria. Ocupado esse posto, o escalador de montanhas míticas não terá mais pessoas ao seu redor e sim objetos cevadores de sua vaidade, úteis à engorda de seu ego, mas absolutamente inúteis às suas necessidades prementes de se relacionar como ser humano.
Quem usa seu projeto artístico para atingir essa meta está na contramão dos mais nobres conceitos de arte. Arte é coisa de gente, é instituto das abstrações e do pensamento humanos. Trilhar a rota dos deuses e semideuses é atalho ilusório para se chegar à redenção, aquela perseguida pela humanidade, cuja busca a faz vagar por caminhos tortuosos e difusos. A arte existe justamente para que essa busca não destrua o coração da humanidade e a faça navegar, ainda que seja a bordo de faróis flutuantes, na certeza de que o exercício da dúvida apontará o cais dos seus sonhos. Sim, trata-se da certeza que mora na dúvida. Pra quem é humano, ser deus é uma alegoria da sua própria ilusão.
Faço arte, porque quero me afirmar como pessoa humana e vivo a avidez de me misturar com meus pares. Não quero que recebam de mim um simples “bom dia” como se fosse um ato de extrema generosidade e nem transformar meu corpo num corpus carregado de simbologias, dotado de uma aura que o torne instrumento de desejo de um simples toque. Quero pegar o mesmo ônibus que todos usam pra se dirigir à vida e à morte. Afinal, não abro mão de ser mortal.
A hiper exposição midiática tira nossos pés do chão e os conduz ao Olimpo. Isso é inevitável na sociedade que se faz refém da indústria da informação e da cultura de massa. Morar no Olimpo é a sentença de quem veste a túnica cintilante das mídias. Isso seria problema pra mim, mas essa condição é objeto de desejo de tantos outros que nem imaginam a fragilidade das relações geradas por essa realidade. Afinal, como confiar em pessoas que não admitem em você a possibilidade de defeitos, de insegurança ou de sentimentos humanos dos mais elementares? Como abraçar a quem se prostra aos pés de um altar onde você está instalado? Quem diz que lhe ama, entrega esse amor a você ou à representação de seus próprios ideais projetados em você? Bom, acho que o melhor mesmo é poder compartilhar amores e dores com quem  habita o mesmo plano astral. Aqui vai meu recado a quem carrega no bolso uma ordem de despejo pra Zeus. Ou mesmo praquele que, em seu desejo de imortalidade, deseja matar Zeus de inveja.


Nenhum comentário:

Postar um comentário