João
Pessoa, mostre os documentos!
Que
tal a identidade?
Adeildo Vieira
Cheguei
na praia cedo pra ver o show de Totonho e atestar a superprodução do grupo Roupa Nova, que viria
a seguir. Felizmente era cedo o suficiente pra ver um grupo de cavalo marinho
infantil se preparando para apresentação. Emocionante ver aquelas crianças, que
traziam no coração e nos olhos a força da história de João do Boi, mestre da
cultura popular falecido há um ano. Nas super potentes caixas de som rolavam
canções da banda britânica Dire Straits.
Depois de Totonho, tivemos que ouvir quase uma hora de música americana
pra DJs. Enfim, vinha a apoteose do Roupa Nova, que não envelhece nas mídias
globais e congêneres.
Não
quero discutir o mérito da música executada na espera para os shows de artistas
locais, até porque sou muito fã do Dire Straits. O que questiono é o porquê de
não tocarem músicas da cena paraibana nos preâmbulos dos espetáculos onde o
grande público está presente. Questiono, sobretudo, porque se trata de eventos
públicos promovidos por quem promove cultura na cidade, e que, por isso mesmo,
deveria aproveitar todos os espaços pra formar público em favor dos artistas locais.
Até hoje essa oportunidade sempre foi desperdiçada, com raras e surpreendentes exceções.
Mas
isso é sintomático! Se o bloco Muriçocas do Miramar, que arrasta algumas
centenas de milhares de pessoas não consegue ter uma identidade, o que dizer do
resto? Sou a favor da diversidade cultural, até porque é assim que concebo meu
trabalho e reconheço a pluralidade que caracteriza a cena paraibana. Mas bem
que o Muriçocas poderia ter consagrado o Esculamba, estética codificada por
Fuba, como uma digital musical do bloco. Esta proposta estética pro pré-carnaval
de João Pessoa (lembrando que não temos carnaval) tem origem em ritmos
nordestinos sincretizados e caracterizados pelos arranjos da genialidade do
guitarrista paraibano Alex Madureira. Mas o Muriçocas continua manifestando uma
miscelânea de ritmos que, na verdade, atendem exclusivamente aos interesses do
mercado global. Por que o maior bloco de arrasto de carnavais prévios do
planeta não consegue lançar um CD anual que fortaleça seu projeto de identidade
e construa um mercado em torno de si próprio? É porque não há projeto de
identidade pra ele.
Na
verdade, ninguém assume um projeto de identidade pra nossa cidade. Os blocos do
Folia de Rua, que têm seus hinos maravilhosos, são arrastados por frevos de
Recife, Olinda e Salvador. E quando não é frevo, são músicas do mercado
carnavalesco da Bahia. As tentativas de sustentação de uma identidade
junina em nossa cidade estão prestes a
sucumbir às pressões do mercado cearense daquilo que lamentavelmente chamam de
forró.Tudo cai aos pés de mercados que alimentam outras praças, como se
não fosse possível criar um mercado a partir de produtos extraídos do umbigo de
nossa cidade. Falta autoestima como manifestação de inteligência capaz de criar
emprego, renda, impostos, público, apoios da iniciativa privada e muito, mas
muito orgulho de ser paraibano. Sem bairrismo, mas bem que podemos exportar o
sol, a praia, o som, as cores, as formas e o sorriso que mora dentro da gente.
A meu ver, esse é o maior capital que temos.
E
salve a cultura popular de nosso estado! Ninguém entendeu ainda que o maior
projeto de felicidade genuíno que temos está na alma dos brincantes. Não
entender isso é correr atrás de um trio elétrico sem freios, ladeira abaixo. Só
vai quem já morreu e não sabe.
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