domingo, 27 de janeiro de 2013

A carraspana do Padre Nezinho



Erasmo Souto

O padre Nezinho era o espelho do virtuosismo. Falava baixinho, sempre aconselhando para o bem. Sua vida era de casa para a igreja. Seu nome real era Stamp Crowell, nascera na Suécia e foi parar em Itabaiana, onde morava há mais de vinte anos.

Padre Nezinho tinha um pequeno defeito. Diariamente, às seis horas da manhã, tomava uma cachacinha antes do banho, na venda de Severino Carlos. Emborcava dois dedinhos de cana e saía para suas atividades de pároco.

Certo domingo amanheceu chovendo, um frio danado. Padre Nezinho completava 25 anos de sacerdócio e haveria missa especial na igreja, para comemorar.  Para espanto dos presentes na venda de Severino Carlos, padre Nezinho engoliu quase uma meiota de cana. Chegou na igreja com a língua um tanto grossa, caindo aquela baba. No Altar-Mor, pegou o microfone e começou o sermão:

--- Caríssimos fiéis (hic!), bom dia. Hoje completo vinte e cinco anos de sacerdócio e por isso resolvi fazer um sermão especial. 

--- Esse negócio vai dar bode – cochichou Herondina ao ouvido de Eudócia, ambas baratas de igreja.

--- Vou falar (hic!) de Sodoma e Gomorra. 

Bebé Chorão, o sacristão, passou a segurar o padre por trás, para evitar que ele caísse. Padre Nezinho continuou:

---  Aquilo era uma terra de cabra safado e mulher gaieira! Uma zona, pra ser mais claro. A mãe de um coisava com o pai de outro!

--- O padre endoidou! --- gritou Maria da Garrafa, a maior quebradeira de cabaço de menino da localidade.

Indiferente ao tumulo que começava, Padre Nezinho continuou:

--- O rei de Sodoma era o maior veado da paróquia. E era gilete, bi, cortava na frente e atrás!

--- Vambora gente – ordenou Machinho, quase arrastando a esposa para fora da igreja.

Os fiéis foram abandonando o recinto, alguns rindo, outros escandalizados. O padre tomou um gole de vinho e explicou:

--- A rainha de Gomorra dava mais do que chuchu na serra e a princesa sua filha levava mais vara do que plantação de inhame.

Enquanto o pastor prosseguia seu sermão pornográfico, os últimos fiéis já deixavam a igreja.

--- Mas Deus na sua infinita bondade entendeu que aquela gente precisava de ajuda e resolveu auxiliar aquele povo devasso. 

Com as últimas palavras de padre Nezinho, os fiéis retornaram, desconfiados. 

--- Naquela época, Deus tomava cada decisão da porra! – estragou o pastor daquelas ovelhas pudicas. 

Inquietação, sussurros, gente se preparando para se levantar de novo.

--- Deus mandou um anjo.

Acalmaram-se os fiéis novamente. 

--- Pois não é que comeram o pobre do anjo!

No dia seguinte, Severino Carlos decretou lei seca na sua venda. Para gente vestida de batina. 

 (Do livro “Paraíba & Pernambuco, um casal muito maluco”)
   

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