domingo, 14 de julho de 2013

POEMA DO DOMINGO

Reflexões de um esqueleto


Neste vil mundo onde não sou ninguém
E tudo em mim é uma notícia antiga,
Que poema vagabundo abriga
Este desastre que vem do além?

Sigo entoando invisíveis cantos
Circunfluindo levas de fantasmas,
Todos reféns de seus ectoplasmas,
Meio demoníacos, meio santos.

E eu nesse bucólico recanto
Adjetivando inexistência,
Exercitando morta paciência,
Suportando o eterno, entretanto.

Aqui debaixo desta árvore torta
Proclamo a anti-desesperação
Que um esqueleto desmorona em vão
A natureza da pessoa morta.

Não estou morto nem estou vivendo,
Desonro a lógica e desarmo Deus,
Sou o flagelo de crentes e ateus,
A sua corrupção eu empreendo.

E eis-me aqui com o poder imenso
De nada ser e ser tão abissal,
Sem carne peçonhenta, sem o mal
De ter uma estrutura, um corpo denso.

Em decomposição, chego ao bom senso
De me reagrupar na natureza
Com a  insubstancial leveza
E inteligência morta que condenso.

Se debaixo desta árvore penso,
Ziguezagueando em infinito sonho,
Porque resta em mim esse terror medonho
Da morte após a morte, que não venço.

F. Mozart

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