Eu me lembro bem desse carro, uma Variant amarela diarreia que a maldade
humana chamava de cabaré ambulante só porque eu tinha o hábito de sempre
carregar uma meia dúzia de mulheres da “vida fácil” pra empurrar o calhambeque,
no caso de uma precisão, entupimento do carburador ou falha no sistema
elétrico. Meu cúmplice nessas aventuras com minha Variant era meu compadre
Sander Lee, cujo irmão, Dedé Braço de Radiola, aparece aí na foto, depois que
eu vendi o carrinho ao pai dos citados, mestre José Ferreira do Sindicato.
Eu querendo seguir a vida dentro dos padrões naturalistas, mudei de
vida, passei a andar a pé, porque o dinheiro do carro gastei numa farra na
cidade de São Miguel de Taipu. Isso se deu nos idos de 1977. Só agora apareceu
essa foto no Facebook, postada pelo Sander Lee. Não é que bateu uma saudade da
minha Variant velha de guerra?
O automóvel em muito bom estado de conservação, foi conservado pelo
mestre José Ferreira como uma joia de família, proibida a venda mesmo depois
dele morto. Assim foi feito. Até hoje a Variant descansa na garagem, como prova
do amor de seu Ferreira pelo carro, porque esse cidadão era muito chegado ao
nacionalismo e a Variant tratava-se de um produto genuinamente brasileiro.
Durou apenas três anos no mercado, que brasileiro não dá muito valor ao que
produz. A Variant ficou conhecida como “Sapatão”, porque era muito parecida com
o Volkswagem Brasília.
Dito isto, quero dizer ainda que o distinto José Ferreira era mestre na
medicina popular, doutor nas plantas medicinais. E também registrar que a
Variant eu adquiri em troca por um Maveric azul cobalto cintilante, carro mais
bebedor do que o proprietário, no caso eu, na época campeão em arremesso de
copo.
Deu-se que um desajustado social com sangue de peixe e consequentemente
com a mãe piranha, achou de dedurar ao meu pai, na época chefe do Departamento
de Trânsito da cidade, que minha vida era dar cavalo de pau no meio da rua em
adiantado estado etílico. Fui proibido de dirigir, bêbado ou sóbrio. Perdi
minha condução para as divagações pecaminosas e farras intermunicipais.
Eurípides era um mecânico metido a filósofo de bar. Numa ocasião, levei
a Variant pra ele consertar com urgência umas esfarrapadas do motor, porque eu
precisava do carrinho. À noite, pretendia viajar em estradas incertas e não
sabidas em busca de umas batidas de bombo e de bunda em determinada zona.
Eurípides ligou o motor, escutou o chiado suspeito, deu o veredicto: “tem que
abrir, vai demorar dois dias, no mínimo”. Diante de minha desolação, jogou a
ideia machista:
--- Camarada, carro é como mulher, só presta a gente tendo dois.
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