À esquerda, Rosival do violão, do mosaico, do cinema e do Ponto |
Sabe o pescador amador que bota seu anzol na
água e fica ao sol o dia todo, esbanjando paciência, suportando os mosquitos,
formigas e lacraus, sem perder a calma? E depois de tanto trabalho, aliás, de
tanta capacidade de suportar incômodos,
pesca um peixinho miúdo, um arranha cu vagabundo,
sem muita sustância. E ainda tem os cabras azarados feito meu compadre pescador
Maciel Caju. Só por desfeita, o peixe comeu sua isca e ainda deu uma cagadinha
no anzol.
Assim é o trabalho do cara que aplica suas
forças e mecanismos mentais em determinada ação voluntária, sem apoio de quase
ninguém. É o sujeito que desafia o ridículo por trabalhar sem ganhar nenhuma
remuneração numa sociedade onde o mais importante é o lucro financeiro. O
pescador sabe que a maré não está pra peixe, que o poço quase secou, que o
anzol enferrujou e os peixes sumiram. Entretanto, permanece no seu posto, volta
a pescar, contra o frio, contra a indiferença, contra o preconceito, contra a
má vontade dos peixinhos, até recolher cada vez uma pescaria maior.
Esse meu compadre Rosival é um desses raros
elementos que lançam seu anzol e esperam até décadas em sua solidão de pescador
de ilusões. Entretanto, não é nenhum fenômeno. Ele é somente um cara normal,
cujas surpresas da vida vão se revelando nas curvas do rio do destino. Faz
alguns anos que entrou no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar para aprender
técnicas de mosaico artístico. Virou mestre, deu aulas dessa arte. Depois, foi
aprender violão com Vital Alves. De novo passou de aluno a professor, formou um
grupo de aprendizes de violão, montou a Orquestra Som do Coração e sai por aí,
mostrando com seus discípulos que é possível, sim, extrair do nada alguma coisa
que preste.
Com seu jeito humilde, seu sorriso tímido,
Rosival foi pescar seus piaus e traíras na arte do audiovisual. Fez cursos no
Ponto de Cultura, aprendeu a mexer com câmeras e a ter uma visão artística do
cinema. Num instante estava na equipe técnica de produções cinematográficas,
pescador de sonhos que sempre foi. Agora mesmo exibe, orgulho, o curta metragem
“Candeeiro”, onde figura na ficha técnica. Daqui a pouco, vai repassar seus
conhecimentos na área para outros jovens, que esse é seu destino e sua missão
de vida.
Pedro era pescador e Jesus lhe disse: “Pedro,
vou te fazer pescador de homens.” Parafraseando, Rosival é tratador de animais
na vida real, e algum deus misericordioso lhe disse: “Rosival, segue-me e eu te
ensinarei como tratar e cuidar de almas sedentas de conhecimento”.
Bem aventurados os pescadores e os peixes que
são seus sonhos. Numa luta ferrenha, pescador e sonho brigam uma briga limpa
entre ilusão e realidade. Nasci pobre e continuo mais nu do que Adão. Minha
riqueza é isso também, essa satisfação de doar o que tenho de melhor para meu
semelhante. Por isso somos irmãos, eu e Rosival.
Alunos de violão de Rosival no Festival do Aboio, em São José dos Ramos, no dia 5 de dezembro |
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