quarta-feira, 3 de dezembro de 2014


Essa vida de locutor de rádio pirata

 

Por Fábio Mozart

“Piratas são vocês, que correm atrás do ouro; nós somos livres”, dizia a rádio livre do começo dos anos 90. A rapaziada corria o risco e adorava isso de mexer com eletrônica, montar um transmissor caseiro e botar sua rádio no ar, invadindo o espectro radiofônico que sempre foi da burguesia, de meia dúzia de tubarões. O movimento quase acabou, não existe mais aquela rádio livre cheia da mística anarquista de mexer com o lado mais sensível da dominação que é a comunicação. A geração que fez parte desse movimento nem mais se liga em rádio. Alguns se profissionalizaram, outros viraram professores acadêmicos, uns poucos ainda brigam na trincheira mais do que complicada das rádios comunitárias.

Comecei a fazer rádio na década de 70. Tenho mais de trinta anos de locutor de rádio pirata. Minha pirataria começou com Modulação em Amplitude. Enterrei o último transmissor AM nas matas que também hoje não existem mais, junto com o sentimento de prazer de partilhar com um grupo a liberdade de se expressar, sem compromisso com o vil metal. A frequência da rádio livre ficou vazia ou foi substituída pelas rádios de crentes “pegue pague”, picaretas das falsas comunitárias ou políticos venais. Acabou a subcultura alternativa que marcava as antigas transmissões livres.

De alguma forma, estamos regressando a essa época em que se emitia sinais de vida inteligente no rádio, sem fins lucrativos. São as rádio web, simples de operar e sem o perigo do cara pegar cadeia. Essas rádios estão se propagando numa escala muito grande. Tem de tudo no universo da rádio via internet. Em quase todas, a qualidade do conteúdo não é muita prioridade. O computador vai aceitando tudo. Nesse mundo da transmissão via web, destaca-se a Rádio Porto do Capim em João Pessoa, a única que ainda opera nos moldes de uma emissora comunitária, com seu conselho que fiscaliza os conteúdos. Devagar, vai formando seu conceito e reunindo gente que se interessa em fazer rádio diferente.

Na Porto do Capim, meu compadre Dalmo Oliveira leva do rádio convencional seu estilo próprio. Ele comanda a seleção musical, roda a música independente e mexe com o jornalismo incipiente da emissora. Falta uma melhor ordem na programação. As músicas são sempre as mesmas, organizadas em playlists repetidas exaustivamente. Melhor assim, porque ainda não é um negócio, não rola jabaculê. Sem a lógica do mercado, a publicidade e demais interesses comerciais não decidem que tipo de música vai tocar. Nessa atmosfera amadora e experimental, a rádio decidiu transmitir uma procissão de Nossa Senhora da Conceição dos navegantes no rio Sanhauá. Acho que é a primeira rádio web a irradiar uma procissão, ainda mais dentro d’água. Eu fui convidado a participar dessa transmissão. Será minha primeira experiência como locutor de procissão, já que até enterro cheguei a narrar nos bons e puros tempos das rádios de fundo de quintal.

A procissão vai ao ar (e à água) no dia 8 de dezembro, segunda-feira, lá pelas nove horas da manhã, no sítio www.radioportodocapim.com.br



 

 



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