quinta-feira, 6 de agosto de 2015

A ponte do rio que caga





Itabaiana do Norte é um território mais ou menos livre em que ninguém sabe exatamente quem manda. Testemunhas ainda vivas garantem que um dia esse lugar teve um gerente. Nessa cidadezinha, precisamente na rua das Flores, registrou-se ontem um acidente. Caminhão caiu em buraco aberto na ponte que liga o nada a lugar nenhum. Segundo relatos verossímeis de algumas putas e meia dúzia de bêbados que testemunharam a ocorrência, com muito esforço, o motorista desceu da cabine e falou em todas as peças da mãe do responsável pela conservação da pontezinha. No seu jeito brasileiríssimo de encarar os azares da vida, o chofer ainda culpou a Dilma, o Mago, a maga, a alta do dólar e a demanda excessiva das raparigas. O caminhão ficou em atitude de quem quer levantar voo daquele ambiente saturado de necessidade e infertilidade, embora tendo uma tradição respeitável de ter sido, em tempos pretéritos, um bairro de animados e convenientes prostíbulos.

Por baixo da ponte, passa um riacho mais poluído do que a mente de Madame Preciosa. Boa parte da imprensa local (boa parte não significa a parte boa necessariamente) esteve no local do incidente, uns por dever de ofício, outros para cumprir o exercício da bajulação a troco de vintém. Sabe-se que o buraco na ponte é parente da rachadura que consome o município. Chamados, os bombeiros mandaram dizer que tinham mais o que fazer. Populares da rua das Flores, com sua habitual presteza, passaram o dia espiando o caminhão e dando pitaco. Pitaco, você sabe, é aquela opinião não solicitada, aquela sugestão ou conselho em que ninguém está interessado.

Entrementes, os repórteres meia boca gravavam os comentários dos populares.

Luiza Maria da Conceição, uma rameira gorda que trabalha lavando roupa pra fora e botando trouxa pra dentro, disse que temia um terremoto de grandes proporções, coisa assim de vinte graus na escala rica.

Luiz de Tal, chapeado e tomador de meropéia, disse que, quando reparou, o caminhão tava dando uma bunda canastra, no que foi repreendido por João de Saia, reclamando para si o mister de dar esses apetrechos cagatórios.

Antonio de Tal, operário de uma fábrica de cachimbo, disse que sempre desconfiou da ponte. “Sempre atravessei com cuidado. O excesso de gente chapada que passa aqui abalou os alicerces”, acredita ele.

Para R.M., que não quis dar as iniciais do terceiro sobrenome, o caminhão estava a serviço do PDS para prejudicar a imagem do PMDB.  

O buraco da ponte tornou-se atração. Pequena multidão está fazendo fila para tirar fotos ao lado do orifício e botar no “face”. O pessoal se rindo com suas cáries de estimação, fazendo “selfie”. Um irmão da igreja dos crentes aparece distribuindo panfleto onde o pastor garante que o buraco é sinal do fim do mundo. Começa a chover. Aparece Sonsinho com aquele ar de idiotice dos de sua espécie, com uma pergunta que ninguém teve coragem de fazer até hoje: “Por que as goteiras sempre aparecem nos dias de chuva?”   


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