Alguém já contou a história da Monga, a
mulher que virava bicho nos parques de diversões de nossa juventude. A Monga
geralmente era uma voluntária caçada por ali mesmo, uma empregada doméstica,
uma moça do povo que topava viver seus 15 minutos de fama em troca de alguns
caraminguás. Geralmente feias, barriguinhas salientes, caras de sofrimento e
humilhação histórica, rostos pintados com papel de cor, pó de arroz e certa
dose de cara de pau. O velho truque da mulher que vira macaco mostrava gradualmente
a figura com fantasia de gorila, para espanto da molecada. Wellington Farias
conta que foi ver a Monga com um medo que vinha dos tempos imemoriais das
cavernas. Quando abriram a cortina imunda, a moça a ser transformada em gorila
era a empregada da casa dos seus pais. Perdeu-se o encanto e o respeito pelo
número mágico.
Aqui na capital Parahyba do Norte, a
velha Monga teima em sobreviver na festa das Neves, uma tradição que se apaga
como uma vela no oceano dos tempos. Os que insistem em manter a Monga apelam
para um saudosismo desbotado, ansiosos por criar uma atmosfera de exaltação, na
cadência do narrador da cena da mulher-macaco, que dava aquele clima de medo. O
narrador é muito importante para a cena da Monga. Quanto mais recursos de
comunicação, mais rico o espetáculo.
A Monga hoje, entretanto, é bicho raro.
Evaporou-se na progressão da ilusão de ótica muitíssimo mais encantadora dos
recursos eletrônicos modernos. Por mais que seja tradicional, o velho truque
não tem mais público para sua façanha canhestra. As mongas, coitadas, se
tivessem acesso às redes sociais, seu status seria “estamos num relacionamento
tipo fim de festa”.
Essa conversa sobre Monga me veio por
inspiração de uma foto de Kleide Teixeira, quando nada porque a gente sempre
precisa de uma desculpa estética para discorrer sobre o patético de nossas
emoções. Eis a Monga na sua jaulinha, ocupando duplo papel de bilheteira e
artista principal do número mágico mambembe, uma função que é a mesma na sua
vida de sobrevivente feminina nesse mundo machista e cruel. As mulheres do povo
acabam por vestir essa fantasia de Monga o tempo todo, como massa de manobra de
ilusionistas geralmente machos, acabando-se nas suas múltiplas funções de
vedetes, trabalhadoras, donas de casa, amantes e até traficantes por ordem dos
companheiros presos.
No fim, elas se superam, despem suas
fantasias de Monga e, por natureza, viram leoas. Faz todo sentido.
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