Na foto, estou ao lado do meu compadre Pedro Lourenço (fardado de agente
do Fórum de Justiça), com Normando Reis e Val
Convenhamos que não é fácil envelhecer. Eu, de minha parte, entro nesse
processo natural sob forte protesto, e foi-num-foi a gente entra em parafuso ao
lembrar que não é mais dono daquele corpo de altíssimo nível que nos levava a
fazer grandes besteiras na juventude. Por isso eu quero o touro amarrado no pé
da cajarana e quero também poder comer torresmo, beber cachaça, caçar rolinha e
tabaco, fumar meus cigarrinhos, sorver meus copinhos de cerveja gelada e
conversar brebote com os amigos de outrora em mesa de bar. Não posso mais fazer
essas extravagâncias, nem tampouco andar, que os joelhos estão apodrecidos de
artrose. Até o ato de ler, um dos meus grandes prazeres nessa vida pequenina,
não posso mais por motivo de invasão de uma tal de catarata e glaucoma na minha
linha de visão. Enfim, adeus Serra Limpa caprichada, até nunca mais peladinha
na beira do rio, esquecidos roteiros de vida boêmia nesses chãos paraibanos.
Digo isso para relembrar esse camarada e suas doideiras, esse eterno
visionário quando se trata de delírios, meu compadre Pedro Lourenço, criatura
que eu não avistava fazia uns bons vinte anos. Encontrei meu compadre vestido
de guarda judiciário, magro e de modos circunspectos, diferente do Laurence de
nossa época, entortador de cabeça e de estilo dos colegas quando moço, sujeito
metido a galo cego, acabador de baile e tomador de meropéia. Hoje, não bebe,
não fuma nem dança por causa de uma tal de diabetes, que Sonsinho garante se
tratar das dançarinas do Diabo.
Foi num sábado de agosto de 1976 que eu vendi minha Variant amarela ao
pai do compadre Sander Lee, por precinho camarada. Com o dinheiro no bolso, fui
apreciar uma festa na cidade de São Miguel de Taipu, levando comigo Pedro
Lourenço, o próprio Sander Lee, Joacir e um tal de Biu Penca Preta que competia
com Tiririca e Muçum juntos em matéria de presepada. Passamos uma noite de
ricos, comendo do bom e do melhor, arrematando galetos no pavilhão da festa,
gozando da cara de fazendeiros e usineiros. Ser rico de repente te dá uma
sensação de vitalidade, mas voltar a ser pobre quando o sol aparece é ruim pra
danado. Foi assim. Gastei todo o dinheiro da Variant, voltamos para Itabaiana
bêbados e lisos. A ressaca traz solidão, medo, culpa e arrependimento. Hoje,
quando volta aquele filminho dessa aventurazinha, damos boas gargalhadas. Valeu
a pena investir meu carrinho nessa noite especial.
Pedro Lourenço ficou conhecido naquela noite por se meter na delicada
intimidade de um baile do interior. Mandou parar o baile, pediu ao conjunto
musical pra tocar tango, pegou um tamborete e saiu bailando no salão, ao som de
um tango maluco. Depois, pediu um som “eletrônico, orgânico e concreto”. O
rapaz do órgão passou a tocar umas doideiras, já que bem pago pelo Lourenço.
Enfim, ele sozinho fez o show, pagou bebidas pra todo mundo e potencializou a
alegria daquele povo com sua performance de bêbado surreal.
No fim, apareceram uns rapazes querendo tirar graça com nossa turma de
novos ricos, no que Joacir Avelino aconselhou ao chefe da rapaziada que não
mexesse com aqueles caras, filhos de altos usineiros em Pernambuco. “Em festa
de jacu, inhambu não pia”, sentenciou Joacir.
Enfim, emendamos a farra no cabaré das Malvinas em Itabaiana onde gastei
meu último centavo. Comemos e bebemos minha Variant em apenas uma noite,
aventura que foi lembrada pelo compadre Pedro após 38 anos.
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