Por Adeildo Vieira
Romualdo Palhano |
Conheci
Romualdo Palhano no início dos anos setenta quando comecei a cursar o ensino
fundamental no Colégio Estadual de Itabaiana. Garotos com pés nos primeiros
degraus da adolescência, vivíamos o exercício de explorar as possibilidades
lúdicas da cidade, de prospectar as minas de alegria nos recantos mais recônditos
dos sítios sem cerca ou dos estádios sem fronteiras na areia do rio, onde
realizávamos copas do mundo de dentro. Para os jogos de sonhar eu era sempre
escalado. E muitas foram as vitórias dos campeonatos contra a tristeza e a
desesperança, momentos em que, sem saber, projetávamos um futuro de glórias.
Aquele
foi o cenário onde construímos nossos castelos oníricos, de bases sólidas,
frontispícios elevados e janelas escancaradas para o mundo. Depois daquelas
experiências vivenciadas na adolescência, tudo o que fizemos em outras paragens
na vida foi reformar aquele castelo, jamais alterando as estruturas montadas
pelas cenas que deram sentido à nossa caminhada de viver. A alma de quem se dá
aos movimentos da infância é vestida por malha tecida de esquinas e colorida
por jardins e quintais. Hoje sabemos o quanto aquelas ruas de Itabaiana – ora
de trajeto infinito, ora aparentemente sem saída, nos deram substância para
sentir o mundo e o quanto nos ensinaram para viver este sentimento. Eu, nascido
em Itabaiana, deixei minha cidade aos quinze anos incompletos. Romualdo,
natural do Rio Grande do Norte, viveu na Rainha do Vale do rio Paraíba por doze
anos, de 1969 a 1981, período suficiente para batizar sua vida nas águas
daquele rio.
Não
bastassem as cenas de rua no traçado de seus cometimentos lúdicos, Romualdo foi
um dos fundadores do GETI – Grupo Experimental de Teatro de Itabaiana, onde
exercitou suas primeiras experiências teatrais junto a aventureiros
incorrigíveis que insistem em moldurar a vida com poesia e de se embrenhar na
luta de resistência contra os dragões do mal que vivem de sujar as vitrines da
aurora. Ali o jovem ator encontrava a fornalha com que iria formar a matéria
prima de seus dias, definindo sua profissão e sedimentando sua devoção pelo teatro.
Depois de 33 anos que deixou a terrinha, foram dezenas de trabalhos realizados
pelo artista, tanto no teatro como na literatura. A Itabaiana dedicou três
livros que investigam a história da cidade em seus acontecimentos mais
importantes, sobretudo no que tange às questões culturais que desenharam o seu
perfil na linha do tempo.
É
muito animador saber que há pessoas capazes de reconhecer a grandeza do lugar
que montou o quebra-cabeças de viver no tabuleiro da infância. Melhor ainda é
ver a contribuição que dão quando se debruçam no seu passado, ajudando-nos a
conhecer as belezas conceituais já vividas e lamentar os novos conceitos que
trocaram árvores por cimento, fecharam cinemas e teatros, viraram as costas
para os personagens da cultura de raiz e flor, que roubam a areia do rio e que
convidam o cidadão a abandonar sua terra em busca de outros horizontes.
Na
semana passada fiquei muito feliz ao reencontrar amigos ativistas culturais da
minha Itabaiana no lançamento de duas obras emblemáticas na busca do
reconhecimento da cidade. Falo dos livros “Itabayanna – Entre Fatos e Fotos”,
de Romualdo Palhano e o livro biográfico “Artistas de Itabaiana”, do
jornalista, escritor, compositor e dramaturgo Fábio Mozart. São obras de
afirmação cultural e política daquela que me deu a régua e o compasso composto
no qual traço minhas canções.
Radicado no Amapá há vinte anos, Romualdo
Palhano prova que há muito saiu de Itabaiana, mas a cidade que pintou sua
adolescência nunca saiu de seu coração. Junto-me a ele e a todos que sabem
reconhecer a grandeza do nascedouro da água pura.
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