quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Minha vizinha é conterrânea do cangaceiro Cocada

Dona Cremilda e sua neta, Socorro Almeida


Ontem falei sobre o cangaceiro Cocada, do bando de Antonio Silvino, nascido na vila de Guarita. Por acaso, descubro hoje que sou vizinho de uma senhora também de Guarita. Trata-se de dona Cremilda de Sousa Almeida, irmã do empresário itabaianense Zé Granfino, do ramo de posto de gasolina. Dona Cremilda mora há muitos anos na Rua Senador João Lira, em Jaguaribe. Vai comemorar 95 anos em dezembro, super lúcida e ativa, conforme testemunho de sua neta, minha amiga Socorro Almeida.


Vovó Cremilda viveu em Guarita nos tempos do cangaço. Ouviu e viu minhas histórias de sujeitos brabos, de lutas sangrentas no esforço cego do homem para dominar seus espaços em uma época sem lei. Comprova muitos relatos sobre Cocada, seu conterrâneo que entrou para o bando de Antonio Silvino muito moço. Seu chefe foi condenado a duzentos e trinta e oito anos e oito meses de prisão pelo que fez nos vinte anos de vida no cangaço. Foi solto em 1937, indultado por Getúlio Vargas. Cocada não teve a mesma sorte. Foi assassinado com trinta e cinco facadas e teve a orelha decepada, guardada como troféu pela polícia de Timbaúba, onde encontrou seu fim depois de trocar tiros com policiais nas proximidades de Serrinha, hoje Juripiranga.

Mas voltando à vovó Cremilda, essa senhora é uma prova de que fazer palavras cruzadas é o melhor preventivo contra doenças da senilidade. Estimulado pelas informações recebidas pelos neurônios, o cérebro fica criando novas ligações e rejuvenesce. Dona Cremilda é viciada em palavras cruzadas desde sempre. Por causa dessa ginástica cerebral, se mantém ativa, lúcida e bem disposta. Vai chegar aos cem anos de maneira geral muito bem fisicamente, com suas mãos cheirando a alecrim, lembrando do dia em que a rezadeira bateu com o ramo do alecrim em sua cabeça, repetindo com aquela voz de assombração: “Eu te desassombro da má sombra que te assombra”. Na velha Guarita de então, remédio era clister de pimenta-d’água, batata-de-purga e palmada com chinelo de sola grossa se não se comportasse bem. Feliz de quem adoecia, porque podia comer galinha cozida com pirão de farinha de mandioca. Era assim o universo de dona Clemilda. Ninguém fique estupefato por ela ainda estar viva e consciente. É de um tempo em que as pessoas viviam suas pequenas alegrias em seus mundinhos fechados, sem conhecer muito o medo do amor, da morte, de vícios, das traições, da doença e da velhice. Vivia-se com a sabedoria dos gatos, evitando o choque com outras forças, tranquilos e normais, sem neuras.



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