A grande ambição dos alquimistas foi a eternidade. A gente está
sempre atrás de algum embargo infringente, seja lá o que significa isso, para
adiar a partida para os vastos campos de Jeová, seja lá quem for essa
divindade. Resulta que os de meia idade estão sempre procurando a ilusão do
rejuvenescimento. O problema é que as juntas e a lei da gravidade estão sempre
aí, lembrando que já passamos o tal cabo da Boa Esperança faz tempo!
O velho Leão aqui já
se prepara na probabilidade de comemorar sessenta carnavais, ainda vivo graças
às estatísticas que andam esticando a expectativa de vida do brasileiro. A
tática é a mesma: empurrar literalmente com a barriga os probleminhas de saúde,
abandonar os melhores vícios, esquecer as cópulas e conluios assombrosos do
passado, tomar os remédios na hora certa e fingir que é vigoroso e resistente,
quando na fila. A gente sente a coluna queimar, os pés doem, o joelho magoa,
mas o velhinho ali, firme, olhando com desejos a fileira dos idosos, sem querer
pagar de macróbio. Se ainda não tenho sessenta, não sou idoso, embora faltem
apenas três meses pra virar sexagenário.
Hoje não deu. A
perna doendo, fila grande, a barriga flácida teve que se meter no grupo dos
excepcionais, na turma dos cabelos grisalhos. O caixa, como todo operador com
seus hábitos modorrentos, demorou séculos até me atender. Eu já devaneando com
a possibilidade de uma fila para os “pé na cova”. Não sou idoso, sou vetusto.
Não sei se tem
fundamento, entretanto suspeito que quanto mais a gente vive, mais tem medo do
aniquilamento. O temor mais besta da humanidade, esse de morrer. Cumpre-se,
apenas, a principal função da vida que é a morte, o desenlace, a jogada final.
Ninguém gosta de nada reticente, sem desfecho. Eu sei que tou falando um monte
de besteiras, mas é pra isso que serve um blog. O fato é que ninguém quer
“partir desta para melhor”.
Alex Castro é um que
não tem medo de morrer. “Minha vida foi linda e foi vivida intensamente, nos
meus termos, do meu jeito. E o futuro, bem, o futuro nos reserva a todos a
velhice, a decadência física, a dor, a solidão, a morte. Quem teve um bom
passado e vive intensamente o presente não tem nenhum amor pelo futuro”.
Quem tem mais medo
de morrer são justamente aquelas pessoas que tiveram passados chatos e vivem presentes
frustrantes, que depositam todas as suas esperanças em um futuro mítico, onde
se mudarão para a casa dos sonhos, encontrarão o príncipe encantado, se
aposentarão do trabalho chato, conseguirão escrever aquele livro... e aí tudo
ficará bem, todas as promessas se realizarão, o futuro, finalmente, acontecerá
em toda a sua plenitude, acredita Castro.
Não tenho medo da
morte. Meu medo é não poder me arrastar mais para a fila dos idosos, ter que
usar o babador e a fralda geriátrica, esquecer quem sou e onde estou, e nem ter
mais a premissa de determinar minha vida ou o fim dela. O milagre da
permanência dessa consciência de leão já me basta. E, por favor, não prolonguem
a agonia de um velho leão lutador: pela eutanásia consentida, o direito à boa
morte.
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