Eu
lendo “Um pé de milho”, livro de crônicas do festejado Rubem Braga, nascido em
Cachoeiro do Itapemirim, Espírito Santo, lugar que também serviu de berço para
Roberto Carlos. No conto “História do caminhão”, narra o caso de um sujeito que
ganhou na loteria e se torna um estranho consumidor. Contrata até duas moças
para falarem inglês e francês em sua casa. “É tão bonito se ouvir falar língua
estrangeira! As pessoas não entendem, mas é realmente muito bonito”, comemorou a
mulher do cara. “A vizinha criticou muito isso, mas está morrendo de inveja,
pois tudo o que se ouve em sua casa é português, e assim mesmo com um sotaque
paraibano que é uma tristeza”, observa o narrador, que não é outro senão o
próprio Rubem Braga.
Ele escreveu isso
em 1946. A revista Brasil de Fato publicou em 2013: “A estudante de direito Mayara Petruso clamou, por meio de
uma rede social na internet, por um assassinato em massa. ‘Nordestino não é
gente, faça um favor a São Paulo, mate um nordestino afogado!’. A moça proferiu
isso por conta da vitória de Dilma Rousseff nas eleições presidenciais,
atribuindo sua vitória ao voto dos nordestinos. A atitude dela, entretanto,
apenas traça uma caricatura histórica de alguns setores da sociedade
brasileira, especialmente o sulista. É de muito que a infelicidade do
preconceito encontra eco nas classes médias e elites do país”.
Rubem Braga foi um sujeito viajado.
Viveu em Cuba, Paraguai, México, Moçambique, África do Sul, Índia e Colômbia.
Grande mestre da língua portuguesa, Rubem não conhecia seu próprio país. Pelo
menos a parte terceiro-mundista da sua pátria “tão distraída”. Repercutiu o
preconceito contra os paraibanos, porque essa é a ideia que têm de nós, mesmo
as tais “cabeças pensantes”. Testemunho do sociólogo pernambucano Chico
Oliveira: “Eu ouvi de Júlio de Mesquita Filho, na
minha cara e na cara de Celso Furtado, há quarenta anos, num seminário
promovido aqui em São Paulo, dizer que os esforços para desenvolver e
industrializar o Nordeste eram em vão, porque o nordestino não tinha
mentalidade para a indústria”, conta. Tratava-se, segundo Chico, de uma
afirmação, antes de tudo, racial. “Era um líder do jornal Estado de S. Paulo, e
o pior é que o Estadão fez a cabeça de metade dos paulistas”, diz.
Assim, construíram o preconceito em
relação ao nordestino que explica um pouco o ódio dessas elites por termos
eleito um nosso conterrâneo, Lula, Presidente do país por duas vezes.
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