“Estes poemas lindos e debochados, mesclados com amor à sua
querida Itabaiana, terra também do meu pai, estes versos são característicos do
meu sempre cunhado, divorciado da minha irmã, sua primeira esposa. Eliel José
Francisco foi o meu inspirador no gosto pela língua inglesa, por meu
bacharelado em Direito. Agora, vamos sentir saudades porque ele se foi para
descansar dos fardos terrenos em outro plano. Adeus, meu cunhado, amigo e ídolo”.
– Regina Maria Queiroz de Lima.
Foi através desta mensagem que fiquei
sabendo da morte do poeta Eliel José Francisco, a quem Itabaiana fica devendo
uma homenagem.
Para relembrar, publico hoje resumo de
duas crônicas que publiquei sobre Eliel aqui na Toca:
Nenhum poeta de Itabaiana
cantou mais sua terra do que Eliel José Francisco. O afamado vate matuto Zé da
Luz tem belos poemas sobre seu universo itabaianense. Eu próprio escrevi um cordel com 380 sextilhas
sobre a história de minha pátria adotiva. Entretanto, Eliel vence pela
quantidade, sem nunca haver publicado um livro em sua vida. Quase todos os
dias, Eliel se debruça sobre uma folha de papel almaço e escreve com letras de
imprensa um poema de amor e saudade alusivo à sua Itabaiana querida. E isso ele
faz a mais de trinta anos, quando foi morar no Recife, perseguindo o sonho de
se especializar na língua inglesa. Hoje é professor aposentado, de inglês, na rede
pública de Pernambuco.
Eu e Eliel fomos crianças e adolescentes juntos em Itabaiana dos anos 60/70. Lembro de Eliel dedicado ao estudo do inglês, uma obstinação extraordinária, dessas que fazem as pessoas se incluírem nessa designação geral de “malucos”, porque “quem tem idéia fixa é doido”, conforme o ditado popular. Lembro dele agarrado à gramática inglesa na beira do rio, dia e noite estudando e praticando uma pronúncia improvável, porque não havia com quem falar o idioma de Shakespeare. Até que apareceu um cidadão americano na casa da professora Nel Ananias. Eliel foi prontamente designado como intérprete.
Além dessas recordações, tenho pastas contendo centenas de poesias de Eliel. Uma pasta intitulada “Itabaiana” guarda a produção dos seus poemas de amor e saudade itabaianense. O poeta sempre enviava pelo correio, de sua casa em Paulista, Pernambuco. Há mais de dois anos deixei de receber os seus poemas. De alguma forma eu me sinto responsável pela guarda de um material valioso, e até me culpo por não ter me empenhado mais para divulgar a obra de Eliel.
Eu e Eliel fomos crianças e adolescentes juntos em Itabaiana dos anos 60/70. Lembro de Eliel dedicado ao estudo do inglês, uma obstinação extraordinária, dessas que fazem as pessoas se incluírem nessa designação geral de “malucos”, porque “quem tem idéia fixa é doido”, conforme o ditado popular. Lembro dele agarrado à gramática inglesa na beira do rio, dia e noite estudando e praticando uma pronúncia improvável, porque não havia com quem falar o idioma de Shakespeare. Até que apareceu um cidadão americano na casa da professora Nel Ananias. Eliel foi prontamente designado como intérprete.
Além dessas recordações, tenho pastas contendo centenas de poesias de Eliel. Uma pasta intitulada “Itabaiana” guarda a produção dos seus poemas de amor e saudade itabaianense. O poeta sempre enviava pelo correio, de sua casa em Paulista, Pernambuco. Há mais de dois anos deixei de receber os seus poemas. De alguma forma eu me sinto responsável pela guarda de um material valioso, e até me culpo por não ter me empenhado mais para divulgar a obra de Eliel.
A volta do poeta fluvial
Eliel José Francisco veio de Paulista
para visitar Itabaiana, sua querida terra natal. Chegou trazendo debaixo do
braço um catatau de versos que traduzem seu bem querer nativista, invocando o
passado e tomando cachaça nas barracas do Carretel e do Cochila. “O passado é
uma carga pesadíssima, e para carregá-lo tem que tomar cachaça com caju e
pitomba”, acredita o poeta Eliel. De vez em quando ele sente a urgência de
visitar Itabaiana, ver seu rio Paraíba onde nadou feito piaba nas cheias de
antigamente.
Como nas epopeias antigas, Eliel quer perpetuar em seus poemas, por todos os tempos, o destino de um povo sem muito destino. “Minha poesia é ‘Os Lusíadas’ do pé-rapado, do fuleiro que toma cana e leva tapa da polícia, do zé-ninguém que leva chifres da mulher e se vinga no mel podre da ponta de rua”. Mas ele é capaz de fazer versos tão bonitos como este:
“...foi em legítima defesa
Que eu matei a saudade...”
Professor de inglês, Eliel José Francisco fala mesmo é a língua da Maloca, do Cochila e do Apertado da Hora. “Passei a escrever versos fesceninos, porque em geral o povo gosta de sacanagem”, explica o poeta. “A prova disso é que votam sempre nos mesmos políticos feladaputistas”, raciocina. Eis alguma coisa nesse gênero:
Que saudade da Quixola
Lá do alto do Cochila
Aonde eu jogava bola
Com o nome de “Quizila”.
É a ausência do gosto
Da boceta de Maria
Que esfregava no meu rosto
O bocetão todo dia.
Eu que não era um jumento
Era apenas um menino
Até hoje inda lamento
Dessa boceta o destino.
Porque eu amo a xoxota
E o gosto do perino!
Como qualquer poliglota
Que não é fresco ou cretino.
Também em louvor à dona vulva, Eliel gosta de declamar:
Diz Eliel lá na feira:
Não és tu, Deus, que governas,
É essa caranguejeira
Que a mulher tem entre as pernas.
Rezando na matriz da Conceição, o poeta pediu:
Ó milagroso Jesus!
A vós só peço justiça.
Fazei com que minha cruz
Seja feita de cortiça.
Nessa última visita, o poeta mandou ver umas estrofes me elogiando, que eu fiquei até tomado por sentimento de gratidão pelas palavras do Eliel, pois o Estatuto do Idoso permite ao velho receber bajulação explícita e caridosa sem ficar acanhado.
Disseram que eu sou poeta
Amante da poesia
Um rimador e esteta
Perfeito na ritmia.
Entretanto, ao ler os versos
Do grande Fábio Mozart,
Nos ritmados processos
E de rima singular,
Pensei: sou meio poeta
Das liras de Itabaiana
Ou, na verdade, um pateta
Que com versalhada engana.
Mas seja lá como for,
Na limitação da lida,
Eu canto com muito amor
Itabaiana querida.
Como nas epopeias antigas, Eliel quer perpetuar em seus poemas, por todos os tempos, o destino de um povo sem muito destino. “Minha poesia é ‘Os Lusíadas’ do pé-rapado, do fuleiro que toma cana e leva tapa da polícia, do zé-ninguém que leva chifres da mulher e se vinga no mel podre da ponta de rua”. Mas ele é capaz de fazer versos tão bonitos como este:
“...foi em legítima defesa
Que eu matei a saudade...”
Professor de inglês, Eliel José Francisco fala mesmo é a língua da Maloca, do Cochila e do Apertado da Hora. “Passei a escrever versos fesceninos, porque em geral o povo gosta de sacanagem”, explica o poeta. “A prova disso é que votam sempre nos mesmos políticos feladaputistas”, raciocina. Eis alguma coisa nesse gênero:
Que saudade da Quixola
Lá do alto do Cochila
Aonde eu jogava bola
Com o nome de “Quizila”.
É a ausência do gosto
Da boceta de Maria
Que esfregava no meu rosto
O bocetão todo dia.
Eu que não era um jumento
Era apenas um menino
Até hoje inda lamento
Dessa boceta o destino.
Porque eu amo a xoxota
E o gosto do perino!
Como qualquer poliglota
Que não é fresco ou cretino.
Também em louvor à dona vulva, Eliel gosta de declamar:
Diz Eliel lá na feira:
Não és tu, Deus, que governas,
É essa caranguejeira
Que a mulher tem entre as pernas.
Rezando na matriz da Conceição, o poeta pediu:
Ó milagroso Jesus!
A vós só peço justiça.
Fazei com que minha cruz
Seja feita de cortiça.
Nessa última visita, o poeta mandou ver umas estrofes me elogiando, que eu fiquei até tomado por sentimento de gratidão pelas palavras do Eliel, pois o Estatuto do Idoso permite ao velho receber bajulação explícita e caridosa sem ficar acanhado.
Disseram que eu sou poeta
Amante da poesia
Um rimador e esteta
Perfeito na ritmia.
Entretanto, ao ler os versos
Do grande Fábio Mozart,
Nos ritmados processos
E de rima singular,
Pensei: sou meio poeta
Das liras de Itabaiana
Ou, na verdade, um pateta
Que com versalhada engana.
Mas seja lá como for,
Na limitação da lida,
Eu canto com muito amor
Itabaiana querida.
Agradeço, em nome de seus filhos, netos e seus irmãos, pela homenagem acima por mim lida ao meu querido cunhado Eliel José Francisco. Ele merece por sua tamanha cultura.
ResponderExcluirObeigada Fábio Mozart, por essa bela homenagem ao meu querido pai. Ele deixou uma inensa saudade.Saudade essa tão grande quanto à que ele sentia de sua amada Itabaina...
ResponderExcluirObrigada Fábio Mozart, por essa bela homenagem ao meu querido pai. Ele deixou uma imensa saudade.Saudade essa tão grande quanto à que ele sentia de sua amada Itabaina. . .
ResponderExcluirPrezado Fabio Mozart, foi relendo essa publicação sua sobre meu pai Eliel José Francisco no seu blog , que me retomou tamanha gratidão pela sua belíssima homenagem a ele. Resolvi escrever-te aqui novamente para dizer-te que seu reconhecimento pela obra dele é para mim de grande valor! Moro há 11 anos na Alemanha mas trago imensa bagagem brasileira, pernambucana e itabaianence! Amo a minha Terra! Sinto muitas saudades dela. Saudades do meu grande pai, que me ensinou os melhores e mais valiosos princípios de vida... Obrigada por publicar suas obras, eternizando sua grandeza e patriotismo! Um forte abraço!
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