Apesar de não ter jamais plantado um pé de maxixe, o Padre João Gomes da
Costa (foto) fundou o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itabaiana, no
início dos anos 1960. Era uma época turbulenta nos campos nordestinos, onde
grupos de esquerda tentavam organizar os trabalhadores em torno das Ligas
Camponesas, e os estamentos mais conservadores procuravam ocupar esses espaços,
fundando sindicatos sob uma orientação mais moderada. Quando irrompeu a
quartelada de 1964, o Padre João recuou e fechou o sindicato, provavelmente
temendo ser acusado de incentivar os camponeses a buscar seus direitos
trabalhistas, o que era considerada uma conduta própria dos comunistas.
Francisco Almeida cobrava do Padre João a abertura do Sindicato no
jornal EVOLUÇÃO.
“Reverendíssimo padre João Gomes
da Costa, eu não sou jornalista, mas conheço o dever da imprensa que é o mesmo
do historiador: ´procurar a verdade acima de tudo e apresentar aos seus
leitores não o que a política estimaria que eles soubessem, mas a verdade tão
profunda quanto ele a tenha podido atingir.` Para cumprir esse dever de procurar
a verdade e difundi-la, não hesitarei ao maior sacrifício de minha parte,
sabendo que, com isso, poderei arranjar muitas intrigas.
É o senhor sabedor de que, quando
aluno seu, fui o primeiro a gritar contra as injustiças que vinha o senhor
sofrendo quando diretor da Escola Comercial Dom Bosco. Sempre encontrou em mim
um estudante que, a qualquer hora do dia ou da noite, estava pronto a ajuda-lo,
bem como à escola. O tempo passou, adquiri minha conscientização política,
dentro da lei, ao lado da justiça social e das reformas de base. O Brasil
evoluiu muito em sua política social nos últimos anos. Trabalhadores começaram a
gritar pelas reformas de base. As forças políticas e econômicas dividiram-se,
uma parte contra, outra a favor. As forças reacionárias de nossa cidade viram o
senhor fundar o sindicato, registrar, fazer eleições. Os poderosos, os
reacionários, os exploradores viram nessa fundação, que considero um grande ato
de justiça e luta por um padrão de vida para os menos favorecidos, um ato
subversivo. Em certos pontos da cidade, onde os reacionários se encontram,
faziam baixos comentários a seu respeito. Maso senhor, sendo ministro Daquele
que mataram crucificado, superou tudo, levando o sindicato sempre para frente.
Em 1º de abril de 1964, o Brasil
foi palco de uma revolução. O novo Presidente da República, o Marechal Humberto
de Alencar Castelo Branco, recebe das mãos do Presidente da Câmara, deputado
Raniere Mazzilli, o poder supremo da Nação. Com essa mudança, o senhor tomou
uma atitude que é um ponto de interrogação e este é o motivo pelo qual lhe
escrevo. Castelo Branco disse em discurso que não era contra as reformas, mas
contra a corrupção e desordem. Eis um trecho do seu discursos: “Caminharemos
para a frente, com a segurança de que o remédio para os malefícios da extrema
esquerda não será o nascimento de uma direita reacionária, mas, os das reformas
que se fizerem necessárias”.
Há uns dias, encontrei com um
camponês filiado ao seu sindicato. Fez queixas, falou das mensalidades pagas,
do sindicato fechado por vontade sua. E agora, Padre João? O seu sindicato não
estava registrado, dentro da ordem, do direito e dos princípios democráticos?
Por que não continua como antes?
Temos farinha porque o agricultor
não duvida diante da mandioca madura; estátuas porque a dúvida não paralisa a
mão do artista; ciência, porque o sábio não vacila ao entrar em seu
laboratório; poemas, porque o poeta não se detém em discutir a utilidade do seu
canto; amor, porque o coração não duvida quando pulsa, nem a virtude quando
age. Padre, um só minuto de vacilação pode perder o homem, a moral, a
honestidade, a personalidade. O senhor, padre, está vacilando. Ainda está em
tempo de decidir. Ou reabre o sindicato ou explica ao povo porque fechou.
Coloco nosso jornal à sua disposição para responder, não a mim, mas aos
itabaianenses que muito comentam este assunto.
(Francisco Almeida)
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