Adeildo Vieira |
Ariano Suassuna conta uma
história de quando ele era menino que viu um filme com os ingleses metendo o
pau nos indianos, botando pra lascar naquele povo meio nu, moreno e esquisito.
Ele ficou torcendo pelos ingleses. Depois que soube da verdadeira história da
dominação inglesa na Índia, entendeu o mal que os ingleses estavam fazendo aos
indianos. Desde então, passou a defender a cultura do seu povo nordestino.
Virou um chato, mesmo com toda sua verve e capacidade de argumentação. Querem
botar o homem até na prateleira do atraso, porque defende nossa música, por
exemplo, da dominação calhorda feita pela indústria da cultura de massa.
Isso para falar aqui de
um negócio chamado jabá, coisa comum nas rádios comerciais, responsável pelo
sucesso repentino de imundícies tipo “lepo lepo” e afins. O jabá é uma manobra
já institucionalizada no Brasil. O representante da gravadora chega na rádio,
reúne os disc-jockey e oferece
determinado valor para espalhar aquela tal música na programação. Tem rádio que
dá até nota fiscal do “jabá”. Bombardeado pela irradiação constante daquele
excreto musical, e sem opção de outro tipo, o ouvinte acaba por absorver o
produto de esgoto. Não sei se foi Adeildo Vieira que contou esse episódio: um
radialista disse que o tipo de música feita por Adeildo não vende, por isso as
rádios não tocam. O compositor itabaianense respondeu: “Você já vendeu alguma
coisa para Portugal?” Ele respondeu que não, daí Adeildo matou a pau: “Pois eu
já vendi, para não falar em diversos países da África onde minha música toca”.
O nobre Adeildo não é de humilhar ninguém, que ele é um sujeito digno e
íntegro, mas nessa hora falou pro carinha da rádio: “Pois, meu amigo, eu vendo
minha música em euro, que vale quase três vezes nosso dinheiro”.
Não sei se é lenda essa
história com Adeildo Vieira, mas comigo se passou algo quase semelhante numa
rádio comunitária da cidadezinha onde esse grande mestre compositor e cantor
veio ao mundo. Levei um projeto para divulgar os artistas locais na dita rádio,
no que foi apresentada logo a conta do jabá: cem reais por quatro horas de
programa por mês. Tive que pagar para tocar Adeildo Vieira em sua própria terra
natal. Satisfiz o preço do jabá para rodar também os discos de Paulo Ró, Pedro
Osmar, Cátia de França e outros de reputação internacional como o próprio
Sivuca. Pouco tempo depois, sem capital de giro, girei os calcanhares e me
mandei da rádio que ignora o músico que leva o nome do Estado para o mundo.
Vergonha e desgosto é
presenciar que nossa juventude está perdendo o bonde da história. Ninguém se
liga à cultura e à tradição, à qualidade e ao bom gosto. Perguntei a uma
professora da cidade se ela sabia quem é Adeildo Vieira. “É da Globo?”,
devolveu.
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