Aviso à praça que já estou dominando um programa de detector
de mentiras virtuais. Ele diferencia a verdade da mentira online. O sistema
automatizado identifica conteúdos duvidosos como tratamentos enganosos,
mensagens hipócritas de protestantes e católicos “falsos à bandeira”, alarmes
falsos e denúncias infundadas, além de notícias equivocadas ou completamente
enganosas. Sim, e aqueles comentários dissimulados tipo “você está linda,
querida!” também são detectados pelo sistema.
Postei isso ontem no Facebook e meu compadre poeta Quelino
Sousa lembrou de uma crônica nossa sobre o assunto. Aí vai:
O homem que não sabia mentir
Fábio Mozart
Tem um sujeito maluco pros lados de Recife que escreve num blog coisas corriqueiras, mas com um gosto bom de feijão verde com galinha torrada e manteiga de garrafa. O nome do sujeito é Samarone Lima. Outro dia ele escreveu uma crônica sobre um cara que não mente nunca.
Uma do dito não-mentiroso: “Estava na praia com uma namorada, tomando uma cerveja, minha mulher me ligou no celular. Atendi. Ela perguntou onde eu estava. Respondi que estava na praia, com a namorada, tomando uma cerveja. Ela disse que não gostava dessas brincadeiras, e desligou o telefone na minha cara”. A moça que estava com ele na praia perguntou quem era. “Era minha esposa, querendo saber onde eu estava”. “Aprendi isso com um louco que conheci há alguns anos. Ele nunca mentia. Comecei a fazer isso, e dá certo”.
Imaginem como seria o mundo, se todo mundo falasse a verdade o tempo todo. Teria graça? O meu amigo Aguinaldo Pabulagem, o mentiroso mais engraçado e charmoso que conheço, não seria reconhecido pela sua verve e imaginação. Mentir é uma arte, que quando levada a sério e exercida com talento, torna o mentiroso um escritor, teatrólogo, poeta, novelista, político ou mentiroso mesmo, desses de mesa de bar, figuras impagáveis como o finado Índio, em Itabaiana, aquele que botou um boteco onde estava escrito na placa: “Bar da Verdade”. Famoso por suas mentiras, Índio costumava dizer que numa grande enchente no Recife, seu velho rádio ABC “A Voz de Ouro” minava água ao transmitir as notícias da tragédia. Isso em Itabaiana!
Nesta cidade cheia de histórias e estórias, dizem que o maior mentiroso aqui nascido e criado foi o velho Zé 41, um caçador de rolinhas perito na arte de mentir. Conheci grandes mentirosos, sem citar nomes porque o artista da mentira não gosta de ser reconhecido como tal, a não ser que já tenha o nome consagrado.
Como a mentira tem pernas curtas, não posso deixar de lembrar meu companheiro Luiz Bobinho, ferroviário baixinho e animado. Se Luiz Bobinho chegasse e dissesse “eu estou mentindo” ninguém acreditaria, porque isso só seria verdadeiro se ele não estivesse mentindo, o que estava fora de questão.
O artista é um farsante, um mentiroso. E o mundo sobreviveria sem arte? A arte de mentir de forma refinada é o que dá o charme e sedução ao escritor, ator, pintor e quem mais se aventure no mundo da imaginação. E quando a gente toma o falso pelo verdadeiro, ou somos consumidores de arte ou otários.
Zé Limeira era um poeta repentista paraibano que não sabia ler nem escrever, mas ficou conhecido pela imaginação mais do que fértil. Imortalizado pelo escritor campinense Orlando Tejo, Zé Limeira é estudado por figurões da literatura nacional, a exemplo de Muniz Sodré que escreveu resenha sobre o livro de ensaios “Zé Limeira, Poeta do Absurdo”, de Tejo. Para o professor da UFRJ, ‘a Poesia de Limeira produz uma espécie de contra-sentido da erudição beletrista’. Zé Limeira viveu na Chapada do Teixeira, interior da Paraíba, e produziu versos, que ‘julgam e exasperam, com a crueldade lúcida do louco, com o lirismo dessabido da criança, com a ousadia lúdica do analfabeto e com o ritmo interno do poeta, o discurso pedante’. Tudo isso traduzido quer dizer: Zé Limeira era um mentiroso de marca maior, que sabia encantar o mundo com suas mentiras rimadas.
Para saideira, uns versos do velho Zé Limeira: “Casemo no ano de 15/ Na seca de 23/A mulher era donzela/ Viúva de sete mês/ Mais não me alembro que tenha/ Um dia ficado prenha,/ Estado de gravidez”.
Pinto de Monteiro, o maior cantador do mundo depois de Manoel Xudu, um dia saiu-se com esse repente: “Nestes dias vou fazer/ Como o nosso Zé Limeira:/ Comprar uns óculos escuros/Desses de tolda de feira/ Botar o bicho na cara,/ Sair cantando besteira"
Fábio Mozart
Tem um sujeito maluco pros lados de Recife que escreve num blog coisas corriqueiras, mas com um gosto bom de feijão verde com galinha torrada e manteiga de garrafa. O nome do sujeito é Samarone Lima. Outro dia ele escreveu uma crônica sobre um cara que não mente nunca.
Uma do dito não-mentiroso: “Estava na praia com uma namorada, tomando uma cerveja, minha mulher me ligou no celular. Atendi. Ela perguntou onde eu estava. Respondi que estava na praia, com a namorada, tomando uma cerveja. Ela disse que não gostava dessas brincadeiras, e desligou o telefone na minha cara”. A moça que estava com ele na praia perguntou quem era. “Era minha esposa, querendo saber onde eu estava”. “Aprendi isso com um louco que conheci há alguns anos. Ele nunca mentia. Comecei a fazer isso, e dá certo”.
Imaginem como seria o mundo, se todo mundo falasse a verdade o tempo todo. Teria graça? O meu amigo Aguinaldo Pabulagem, o mentiroso mais engraçado e charmoso que conheço, não seria reconhecido pela sua verve e imaginação. Mentir é uma arte, que quando levada a sério e exercida com talento, torna o mentiroso um escritor, teatrólogo, poeta, novelista, político ou mentiroso mesmo, desses de mesa de bar, figuras impagáveis como o finado Índio, em Itabaiana, aquele que botou um boteco onde estava escrito na placa: “Bar da Verdade”. Famoso por suas mentiras, Índio costumava dizer que numa grande enchente no Recife, seu velho rádio ABC “A Voz de Ouro” minava água ao transmitir as notícias da tragédia. Isso em Itabaiana!
Nesta cidade cheia de histórias e estórias, dizem que o maior mentiroso aqui nascido e criado foi o velho Zé 41, um caçador de rolinhas perito na arte de mentir. Conheci grandes mentirosos, sem citar nomes porque o artista da mentira não gosta de ser reconhecido como tal, a não ser que já tenha o nome consagrado.
Como a mentira tem pernas curtas, não posso deixar de lembrar meu companheiro Luiz Bobinho, ferroviário baixinho e animado. Se Luiz Bobinho chegasse e dissesse “eu estou mentindo” ninguém acreditaria, porque isso só seria verdadeiro se ele não estivesse mentindo, o que estava fora de questão.
O artista é um farsante, um mentiroso. E o mundo sobreviveria sem arte? A arte de mentir de forma refinada é o que dá o charme e sedução ao escritor, ator, pintor e quem mais se aventure no mundo da imaginação. E quando a gente toma o falso pelo verdadeiro, ou somos consumidores de arte ou otários.
Zé Limeira era um poeta repentista paraibano que não sabia ler nem escrever, mas ficou conhecido pela imaginação mais do que fértil. Imortalizado pelo escritor campinense Orlando Tejo, Zé Limeira é estudado por figurões da literatura nacional, a exemplo de Muniz Sodré que escreveu resenha sobre o livro de ensaios “Zé Limeira, Poeta do Absurdo”, de Tejo. Para o professor da UFRJ, ‘a Poesia de Limeira produz uma espécie de contra-sentido da erudição beletrista’. Zé Limeira viveu na Chapada do Teixeira, interior da Paraíba, e produziu versos, que ‘julgam e exasperam, com a crueldade lúcida do louco, com o lirismo dessabido da criança, com a ousadia lúdica do analfabeto e com o ritmo interno do poeta, o discurso pedante’. Tudo isso traduzido quer dizer: Zé Limeira era um mentiroso de marca maior, que sabia encantar o mundo com suas mentiras rimadas.
Para saideira, uns versos do velho Zé Limeira: “Casemo no ano de 15/ Na seca de 23/A mulher era donzela/ Viúva de sete mês/ Mais não me alembro que tenha/ Um dia ficado prenha,/ Estado de gravidez”.
Pinto de Monteiro, o maior cantador do mundo depois de Manoel Xudu, um dia saiu-se com esse repente: “Nestes dias vou fazer/ Como o nosso Zé Limeira:/ Comprar uns óculos escuros/Desses de tolda de feira/ Botar o bicho na cara,/ Sair cantando besteira"
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