quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Saga do doente pobre

Jacinto Moreno filmando Orlando Otávio e Fábio Mozart em programa de rádio. Ele quer fazer um documentário sobre minhas presepadas artístico-culturais


Meu compadre Jacinto Moreno também está com crise de artrose no joelho esquerdo. Trabalhador na Prefeitura de Santa Rita, o rapaz perambula há dias pelos consultórios dos postos de saúde para conseguir um atestado médico. Pobre não tem direito a ficar doente. Prometeram ao Jacinto começar o tratamento fisioterápico em outubro. Tem mais de 300 pessoas na fila. Nenhum médico quis assinar um atestado, apesar do raio X ter mostrado a lesão no joelho do paciente.

Sinto-me enjoado diante do que é a mais miserável realidade deste país. A desigualdade é grande demais. Se quiser buscar saúde, o pobre tem que ter sorte para ser atendido no postinho. Se for atendido, espera dois meses para fazer os exames. E atestado médico, só se for doença terminal.
 
Agruras do pobre paciente que só não me atingem porque sou aposentado, não preciso de atestado médico. Meu compadre andou contando como vive cercado de vermes pulsantes, cuja atividade maior é puxar saco dos chefinhos e chefões numa repartição que cuida de doentes mentais. É um ambiente muito ruim, de péssimo astral. Outro dia, a mulher do prefeito botou pra fora uns funcionários inadaptados no papel de bajuladores, foi uma grita geral entre os doentes. O pobre Jacinto, com a perna inválida, teve que correr atrás dos doidinhos. Afastar-se de fatos e pessoas negativas é o primeiro passo para evitar doenças. Jacinto trabalha como porteiro, apesar de ser um artista criador, cineasta e teatrólogo. Não lambe os beiços como um vira-latas quando avista um poderoso/asqueroso qualquer, por isso não sai da portaria.

Dizem para a gente encarar a realidade com os pés no chão. No nosso caso, como fazê-lo com a pata inchada e doente? Ontem, Jacinto veio me visitar. Arrastou-se do bairro dos Novais a pé para o Posto Médico de Jaguaribe em busca de um atestado. Não pude levar o meu compadre em casa porque não posso dirigir. Ele seguiu seu caminho, manquitolando. É um cara que jamais se deixa acomodar pela vida e se desdobra para trabalhar cada vez mais. Está planejando produzir um filme, sem um vintém.

O passar dos anos é irremediável. Eu e Jacinto somos cavaleiros andantes em busca de sonhos, o mais das vezes irrealizáveis. O problema é que, com o avanço da idade, a burra de Sancho Panza já não quer trotar, por causa do processo degenerativo dos membros inferiores. 

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