Morro
quando adentro o gabinete
Onde
o sócio o e o alcaguete não me deixam nunca em paz
O
triste em tudo isso é que eu sei disso
Eu
vivo disso e além disso
Eu
quero sempre mais e mais.
Este
é um trecho da música do cara que queria botar o bloco na rua, Sérgio Sampaio.
Pensei nesse poema quando acabei de falar com um rapaz amigo meu, assessor de
um prefeito desses que se aproveitam do pensamento alienado da vida brasileira
e fingem que administram para uma galera que olha deformadamente as relações de
poder, aceitando a realidade fantástica que daí se cria. O assessor me disse, e
eu já sabia, que na prefeitura todos mandam e ninguém tem força para nada. O
mais comum é o prefeito fingir que governa, procurar agradar todo mundo e
deixar tudo relativamente abandonado.
Homem
ciente do seu papel como profissional, o assessor vai tocando o barco como
pode. Das coisas da administração, o cara ta mais por fora do que mão de
afogado. É um assistente imaginário de uma gestão “faz de conta”. De modo que a
oração por aquelas bandas é: “Nossa Senhora do Desmantelo, rogai por nós que
recorremos a Vós”. Planejamento sério é mais difícil ali do que desodorante pra
suvaco de cobra. Um dia a casa cai, mas, antes que caia, “aproveitemos enquanto
Bras é tesoureiro”.
Esse
Brás deve ser um sujeito muito antigo, do tempo colonial, malversador das
patacas reais portuguesas. No entanto e todavia, se Deus é brasileiro, a vida é
um grande carnaval. Esparramemos nossos buchos na cadeira do bar e tomemos a
primeira do dia em honra ao deus Momo, com o pensamento no tolerante tesoureiro
Brás e seu chefe desobediente às leis do país, mas flexível aos preceitos da malandragem
oficial. Falando nisso, bota na vitrola o velho disco de Chico:
Agora
já não é normal, o que dá de malandro
Regular
profissional, malandro com o aparato de malandro oficial
Malandro
candidato a malandro federal
Malandro
com retrato na coluna social
Malandro
com contrato, com gravata e capital, que nunca se dá mal
Carnaval
da choradeira, diga-se de passagem. Carnaval da crise. Para os de minha idade,
os prazeres da carne já nos abandonaram. Atualmente, nós, os coroas,
enriquecemos nosso espírito com aprazimentos mais elevados, tipo massagear as
pernas antes de dormir para poder levantar no dia seguinte. Ninguém esqueceu,
no entanto, as delícias da folia, notadamente os encontros e desencontros
carnais, profundamente humanos e safados.
Notai
que nos carnavais de antigamente, as troças satirizavam os tipos e costumes da
sociedade, num anarquismo ébrio de três dias revolucionários. Já não tem graça
zombar dos tiranos e dos hipócritas. Carnaval de hoje vetou o aroma volátil das
lanças, substituídas por pedras terríveis e terminais. Do velho entrudo
português, onde se jogavam ovos, farinha e água nos passantes, evoluiu para o
Pierrot, Colombina e Arlequim, terminando no bloco dos idiotas unidos. Raposa
velha e entrevada, repito a fala da fábula: “Não vou brincar carnaval. Está
abaixo de minha honradez e decoro”.
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