Como
é que a escola dos pobres mantida pelo governo da burguesia poderia ensinar
crianças a se tornarem cidadãos livres e conscientes? A inquirição me foi feita
há muitos anos por um professor “extremista”. Essa questão crucial ainda
incomoda professores comprometidos em quebrar os anéis da imbecilidade e
pensamentos retrógrados no ambiente da escola pública. Quase todos os que
ponderam sobre isso avaliam que a única saída seria uma revolução, que jamais
será feita. Os que baseiam seu trabalho de mestres em princípios pessoais de
honestidade intelectual e fraternidade, fazem sua parte. Não interessa se a
escola reconhece, ou o prefeito aprova, ou mesmo que seus colegas legitimem e
reproduzam seu trabalho. Vão lá e tiram do próprio salário magro a grana para
bancar projetos culturais para crianças maltrapilhas, famélicas, abandonadas
pelo Estado e esculhambadas. É impossível a democracia em um país assim, mas é
possível que um humilde professor pegue seu lugar e caminhe dentro daquele
processo histórico que move a humanidade, chamado luta de classes.
No
dia 29 de fevereiro eu entrevistei o professor Francisco Diniz na Rádio
Tabajara, no programa “Alô comunidade”. Ele é da área de educação física, mas
trabalha também com formação cidadã através da escrita, leitura e da música. É
autor e coordenador do projeto “Pé de serra”, onde ensina crianças de 10 a 14
anos a tocar sanfona, violão, pandeiro, zabumba e outros instrumentos. No
balanço do forró raiz, ele acaba também produzindo folhetos de cordel,
modulando a cabeça dos garotos na sintonia da consciência social. “O povo
desinformado dá no que deu: elegem Jair Bolsonaro”, certifica o mestre.
Meu
Brasil brasileiro está cheio de pessoas assim, generosas, desinteressadas em
bens ou reconhecimento, dedicadas a arranjar seja onde for algum nutriente
cultural para mentes em formação. A proteína e sais minerais que Francisco
Diniz oferece é a cultura regional nordestina e paraibana, tão menosprezada
nesses tempos onde a mundialização do capitalismo lesiona mortalmente as
sociedades do terceiro mundo e suas tradições.
Indiquei
o nome do poeta e professor Francisco Diniz para receber diploma de honra ao
mérito cultural da Academia de Cordel do Vale do Paraíba. Faço questão de
homenagear pessoas assim, até por conexão com minhas experiências pessoais
nessa área. Fui voluntário em muitos projetos culturais e sociais em Itabaiana
e Mari, cidades onde morei. Francisco levará para receber o agraciamento seus
alunos da Escola Paulo Jorge Rodrigues de Lima e Emília Moraes Neta em
Lerolândia, comunidade desvalida no município de Santa Rita. Gabriel, Eugênio,
Cauã, Alessandro e os demais meninos do projeto “Pé de serra” prestarão tributo
ao professor poeta da cidadania e elevarão a auto estima com os aplausos na
batida da zabumba e no chiado da sanfona mirim.
Sobre
cultura em Santa Rita, lembro sempre de um episódio engraçado e grotesco ao
mesmo tempo. O prefeito do lugar, (por sinal, morto recentemente), foi
apresentado ao vigilante:
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Doutor, este é o vigilante fulano, um artista. Ele faz cinema, merece ser
melhor aproveitado na Prefeitura.
E o prefeito:
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Ele é ator principal? Se não é, não vale nada!
Os
meninos de Francisco serão atores principais em um sarau artístico da
burguesia. Pelo menos nessa noite serão respeitados e aplaudidos, a despeito da
discriminação social. O jornal conservador Estado de São Paulo publicou
editorial em 1956 dizendo que “ser pobre é um problema endocrinológico; as
glândulas não funcionam bem no sujeito, ele vira comunista”.
Ô, meu caro poeta, muito obrigado pela crônica tão generosa! Viva a cultura popular! Salvemos a educação!
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