sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A poesia pousa onde quer


Ela é uma jovem senhora, casada, três filhos, moradora de uma comunidade humilde da cidade de Itabaiana, Província da Parahyba do Norte. Chegou timidamente no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar procurando o autor do livro “História de Itabaiana em versos”, que sou eu mesmo e que por acaso estava na biblioteca Arnaud Costa. Mostrou três cadernos grossos cheios de poemas de sua autoria. Pediu uma apreciação e disse que se inspirava em mim para poetar. Fiquei até meio encabulado com a confissão de simpatia pelo meu modesto livro escrito em sextilhas cordelescas. O nome da poeta: Luciana Karla. Perguntei se podia tirar uma foto dela para publicar no meu blog. Permitiu, embaraçada e levemente feliz.

Cedi à vaidade de não ser rigoroso e mostrar-me magnânimo. Disse a ela que os versos são bons e merecem lapidação. Na verdade, a mocinha só leu até hoje um único livro de poesia, que é justamente o meu. Tem muita estrada pela frente. Precisa ler e estudar muito para um dia desabrochar sua vocação poética. Todo indivíduo é único e insondável. Quem sabe o que fará essa moça de sua vida? Enquanto rabisca seus primeiros escritos no caderno escolar e sonha com seu projeto literário, quem sabe se não vai lentamente amadurecendo a consciência de linguagem e acaba por conceber uma obra interessante?

Como primeiro poeta que apareceu na vida de Luciana Karla, sinto-me de certa forma responsável pela descoberta da sua emoção literária. Nunca mais ela verá a vida do mesmo jeito depois de ler o básico de nossa boa literatura, incluindo os poetas, se um dia estiver disposta a isso. Eu mesmo acabei de ler três livros de José Saramago, que tiveram um significado especial na minha visão do uso estético da linguagem.

Não me atenho ao valor literário dos versinhos da moça. Eu mantenho a fé em certas bandeiras. Uma delas é que a cultura é a tábua da salvação de um povo. Cada geração se eternizará de acordo com a sua cultura. A atual geração é vítima da mediocridade globalizada. Se meu livrinho serviu para estimular a atividade criadora de uma moça pobre do interior da Paraíba, já valeu a pena o esforço de tê-lo escrito e publicado. São coisas pequenas que para mim têm real valor. A vida sem isso é uma boa duma merda.

Nenhum comentário:

Postar um comentário