domingo, 26 de janeiro de 2020

A “merdocracia” emporcalhou meu ambiente



Décio Pignatari escrevia crônicas na Folha de São Paulo nas décadas 80/90, refletindo sobre a agonia da ditadura e as febres políticas subsequentes: a “febre do paraíso” que foram as “diretas já”, a “febre da frustração” que foi a morte súbita de Tancredo Neves, a “febre da mágica” com o Plano Cruzado. Décio Não viveu para escrever sobre a “febre do topete boceteiro” de Itamar Franco, a “febre do sapo barbudo” de Lula e a “febre do realismo fantástico” de Dilma. Talvez não sobrevivesse à “febre do vampiro” que preparou a vinda de uma febre maior, a “febre do pântano troglodita” que vem infelicitando a “pátria tão subtraída” por hipertermias kafkianas.

Reli seu livro “Podbre Brasil” em plena euforia declinante da “febre do pântano”. Descubro alguém próximo a mim que votou no “coiso” e o defende. Onde foi que errei? Como esperado, a gestão do capitão é uma indigestão. Para os artistas e produtores culturais, o governo dirige seu ódio insano de ultradireita mentecapta. É triste constatar que poetas e músicos apresentem armas com os dedos, embalados por fake news de grupos de néscios em redes sociais. O governo que nos desgoverna tem um e meio por cento de artistas que o apoiam, entre eles esse músico, fã do histrião.

Não quero crer que esse rapaz seja um liberal. Sua vida acadêmica transitou pela área técnica. Estudou estatística. Apresenta um comportamento ideológico semelhante a 48% dos brasileiros, com perfil de direita, para ficar na sua área. Números do Data Folha. Desconfio que seu maior problema foi a falta de leitura. Sua forma de expressão é a música. Não sei como se deu essa disritmia cultural, mas me entristece. Se esse governo da “merdocracia” não me atingiu pessoalmente ainda com suas atitudes excludentes contra velhos, pobres, servidores públicos e militantes sociais, só essa ovelha desgarrada do meu aprisco ideológico ulcerou o velho Leão.

Termino citando o poeta Lau Siqueira: “Esse governo é marcado pelo ódio a tudo o que seja inteligência, ciência, cultura, arte, em suma, o ódio à criação. Não é fortuito que Hitler, que quis ser pintor, tivesse um gosto estético tosco, e que o nazismo perseguisse, como “degenerada”, a melhor arte da época. É verdade que os semifascistas Ezra Pound e Céline brilham no firmamento da cultura do século 20 —mas são agulha no palheiro”.

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