sábado, 27 de março de 2010

A aurora do poeta


Antonio Costta pediu a Deus que lhe desse um estilo tão natural e mínimo como a liberdade limpa do voo do anum, para cantar a fé e o amor. Sensibilidade não lhe falta, acredito. Tal pedido gerou as primeiras formas poéticas, recalcitrantes, do vate do Pilar. Mas Deus, na sua infinita sapiência, não cria as formas já definidas. Vai nascendo aos poucos o perfil da invenção, até a perfeição da forma e da alma.

Há um claro avanço no percurso de Antonio Costta rumo à poesia que traz no âmago e que lentamente aflora. Seu último livro, “Coletânea Poética”, representa a nova geração do seu gênio criador. Consegue ser ingênuo na aparência e profundo na essência. Na alma sonora do poeta já se vislumbra o enigma de uma densa criatividade.

Agradecido, Antonio Costta “chama o Senhor em oração”. Não se imagine que seja fácil falar de fé e de amor. Originalidade nestes temas é uma concha perdida no mar do discurso, a pedra de toque sempre pretendida, nunca à mercê. A ideia parece sempre escapar às formas da representação. Mas o “juntador de palavras” persegue com obstinada resistência a percepção do sentimento do mundo lírico, engendrando seu trabalho nos termos de uma constante vitória do enlevo poético sobre o banal e o já dito.

O universo sensível se materializa em versos aparentemente sem profundidade. Pouco importa se ele quer “despertar o alvorecer da aurora”. Na lata do poeta “se tira o que não tem e se bota o que não cabe”, conforme sustenta Pinto do Monteiro, esse gênio do improviso. Poesia é jogo de palavra, é metáfora da metáfora. E quem sou eu para questionar a aurora do poeta?

“Ilumina meus versos, ó meu Senhor”, suplica Antonio Costta. Calcado na sua fé, o poeta pilarense/itabaianense constrói seu próprio plano de consistência, sem medo da rima e da métrica. O amável “juntador de palavras” me convida para escrever algumas linhas sobre sua “Coletânea Poética”, que li procurando algum foco na temática/problemática social, que é o tom das minhas próprias composições. Trata-se de um livro de poesia sobre os olhos da amada e a força de Deus, análogo aos Cantares de Salomão. Não cabe blablablá existencialista nem denúncia social. Só de vez em quando, de um jeito que lembra Gilberto Gil nos tempos da Tropicália, cantando as mazelas dos joãos que trabalham na feira e na construção civil.

É dia santo
É feriado
É João Brasil
Desempregado
Desquitado
Processado
E confinado
Numa prisão.

Numa prisão
Acorda João!

Daí apareceu a revelação de compositor que é o nosso Vital Alves, musicando o poema com originalidade e modernidade. Deus, na sua infinita sapiência, consagrou as palavras de Antonio Costta para os acordes dissonantes do maestro, uma mistura que promete. A fúria santa do poeta embalando os tons e semitons do músico, no consagrado recinto que é a vida.

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