quarta-feira, 26 de agosto de 2009

MIRO DO BABAU É O CARA!





Em Mari vive um cidadão por nome Ramiro Freire, conhecido como Miro do Babau. Roupa extravagante, paletó vermelho, óculos escuros, cravo na lapela, chapéu “cheguei”, ele anda pelas ruas tocando um pandeiro e cantando velhas cantigas de boemia. É um sujeito verborrágico, quando se espalha é difícil juntar.

Figuraça, esse Miro do Babau, estrela de uma roda de exposição da arte do mamulengo promovida recentemente por um grupo de pesquisadores do Ministério da Cultura. De uma hora para outra, Miro foi transformado em “patrimonio imaterial da Paraíba”. Levaram nosso herói para um luxuoso hotel na orla de João Pessoa, onde também estavam os mestres Clóvis e Luiz do Babau, de Guarabira, mestre Paulo de Mogeiro, mestre Maestro de Bananeiras e mestre Inaldo de São José dos Ramos, além do mestre Vavau de João Pessoa. Tantos mestres mamulengueiros juntos, depois que abriram suas malas de bonecos foi um fuá medonho. O que saiu de beneditos, marias quitérias, cabos setenta e o diabo a quatro não foi brincadeira, ou melhor, foi brincadeira das boas a noite toda.

Miro do Babau parecia um dez réis trocado na roda de conversa, onde os mestres puderam contar suas histórias de vida, as dificuldades que enfrentam para manter sua arte e falar dos seus espetáculos. Muitos desses mestres já deixaram de brincar, uns porque viraram protestantes, outros porque não conseguem interessar as novas gerações para o seu “brinquedo”, que não pode enfrentar o que a indústria cultural impõe através da TV e outras mídias. Alguns ainda tentam resistir, mas não são incentivados pelas instituições do poder público que não valoriza esses artistas populares. “Só sou chamado para trabalhar no dia do folclore, assim mesmo de graça”, reclama Miro do Babau.

Mas ele não desanima. Tem o entusiasmo de criança, admirado pelos que assistiram sua apresentação em João Pessoa, basicamente pesquisadores, alunos e professores da UFPB. Na platéia, Emilson Ribeiro, pesquisador da cultura popular e responsável por esta área na Fundação Cultural de João Pessoa – Funjope. Apenas um prefeito veio prestigiar a apresentação do seu artista, que foi a prefeita de São José dos Ramos, Dra. Maria Aparecida Rodrigues, conhecida por Dra. Cida. Na conversa com o grupo, mestre Miro do Babau contou sua história, de um jeito apressado e impaciente como é seu estilo, mas depois “encantou a todos cantando uma das pérolas do seu repertório de cantor brega, mobilizando toda a platéia com a sua crença na maravilha da vida”, conforme afirmou um dos pesquisadores. Um jovem por nome Jonas acompanhava o mestre Miro, fazendo o papel de Mateus, que é o cara que fica na platéia interagindo com os bonecos, falando diretamente com eles. São chamados também de “secretários”, os que dialogam com personagens como os policiais, o capanga, o coronel, o padre, o catimbozeiro, o boi, a cobra e tantos outros.

O mestre Inaldo de São José dos Ramos também foi destaque na apresentação, principalmente na cena do coveiro carregando o morto. A incelença e a movimentação de cena, executada de forma solene e poética, silenciou a platéia. No final, ficou a certeza de que esses artistas de uma arte em extinção ainda não estão isolados do mundo. Alguns, como esses pesquisadores, buscam caminhos que possibilitem a manutenção do brinquedo e a continuidade do babau.

Quanto a Miro do Babau, voltou para Mari nem orgulhoso nem mais consciente do seu valor como artista. Continua com sua vida de alegrar as pessoas com suas canções bregas e seu teatro de bonecos pra quem quiser ver/ouvir, sem se preocupar com esse negócio de preservação da cultura popular. Mas eu sei que ele é o cara. Muita gente em Mari, inexpressiva culturalmente, faz tudo para aparecer, sem conteúdo ético, moral ou cultural, na ânsia de dar vazão ao seu estrelismo estéril. Vaidades vazias diante de um Miro do Babau, esse sim, um artista que orgulha a terra do mestre Antonio Galdino, o maior mamulengueiro de Mari, já falecido.

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