domingo, 11 de abril de 2010

O PRAZER DA IMAGEM E O DOMÍNIO DO MEDO


O Ponto de Cultura Cantiga de Ninar quer acalentar nossas emoções com o prazer da fotografia, a visão do nosso microcosmo inventado pela arte fotográfica, que nos remete ao nosso próprio universo imaginativo, incitando o potencial de recriar o belo. A cultura visual será estimulada pelo Concurso de Fotografia 26 de Maio, em homenagem aos 119 anos de Itabaiana (regulamento no blog do Ponto de Cultura Cantiga de Ninar - www.pccn.wordpress.com).

Trata-se do compromisso com o incentivo à nossa auto-afirmação, unido à satisfação de fruir essa atividade. A aventura visual já teve início. É pegar sua câmera, sempre no sentido de obter um ângulo diferente para aquela paisagem itabaianense, mostrando um rosto inusitado de sua cidade, não necessariamente de nossas referências históricas. Pode ser um beco, um flagrante de paisagem humana, aquele ângulo insuspeito, a descoberta de uma cidade pela lente da poesia, da sensibilidade e da arte.

Jurandir Pereira, amigo itabaianense que mora em João Pessoa, informa que o garoto linchado recentemente, durante tentativa de assalto, era de Itabaiana, da comunidade Açude das Pedras. Veio à capital para estudar, morando em casa de uma tia. Foi quando teve o encontro funesto com o crack e sua breve existência mudou de rumo, até ser trucidado no jardim de uma casa no Bessa. Um aparte para constatar irônica e tristemente: nossa outrora pacata capital já ostenta adesivos que se viam no Rio de Janeiro das balas perdidas e dos arrastões: “Gosto de viver perigosamente: moro em João Pessoa”.

Como um vírus, o medo e a violência tomam conta das mentes das pessoas. Na cabeça paranóica da classe média, o desconhecido provoca medo e angústia. O menino do Açude das Pedras saiu de uma comunidade extremamente pobre para outra marcada por abissal desigualdade. A ambição de poucos ampliou o hiato entre ricos e pobres. Agora, é inútil querer que um cara jovem, relegado involuntariamente à pobreza absoluta, atingido pelo apelo de consumo, seja manso e igual aos que o discriminam e humilham. A elite impõe a diferença e afasta a Nação de um futuro digno.

Voltando ao concurso de fotografia, aí pergunta o questionador: podem concorrer fotos de nossa miséria e abandono? Que melhor foto para expressar nossa pobreza, injustiça e descaso do poder público, se não a imagem macabra do menino do Açude das Pedras despedaçado pela fúria de uma classe média doente e que vive sob o domínio do medo? Essa foto, certamente, não vai ganhar o primeiro lugar no concurso. Que foto identificaria nossa esperança, talvez utópica, em acreditar que o futuro de Itabaiana e do Brasil possa ser melhor e diferente?

A construção da tragédia, o cotidiano do mal, a naturalidade do crime, o aviltamento do ser humano também são, infelizmente, quadros que fazem parte da paisagem humana da outrora pacata Itabaiana, que já exporta carne fresca para o inferno das drogas e das matanças na também outrora pacífica João Pessoa.

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