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sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Susto do poeta na porta do cabaré de Topada

A turma na barraca de Ponei, tomando água que passarinho não bebe nem recomenda


UM POETA MENOR

Disseram que eu sou poeta,
Amante da poesia,
Um rimador e esteta
Perfeito nessa porfia.

Porém, ao ler esses versos
Do grande Fábio Mozart
De ritmados processos
E de rima singular,

Pensei: sou meio poeta
Das liras de Itabaiana,
Ou, na verdade, um pateta
Que com versalhada engana.

Mas, seja lá como for,
Na limitação da lida,
Eu canto com muito amor
Itabaiana querida.

Eliel José Francisco


Esse poema de Eliel José Francisco está numa velha pasta com mais de 200 poesias do meu compadre itabaianense, que atualmente mora em Paulista, Pernambuco. Eliel escreve sobre sua terra natal todos os dias, em papel almaço, com lápis tinta. Não sabe datilografar nem digitar no computador. É mestre em inglês, idioma que aprendeu quando menino em Itabaiana. Filho de família pobre, apaixonou-se- pela língua do Tio San, passou a vida ensinando. Hoje, aposentado, leva o tempo a lembrar seus tempos de rapaz, quando tomava banho no rio Paraíba cheio, descendo na correnteza.

Nunca mais Eliel mandou seus poemas pelo correio. Faz tempo que não vejo meu amigo, o garoto prodígio que quando estava no formato espermatozoide, na hora de ganhar a corrida para o útero de sua mãe, gritou:

--- Quem vier atrás que feche a porteira, que eu vou cair na bagaceira!

Isso ele berrou em língua de gringo. Já naqueles prematuros momentos, o cabra soletrava um inglês de dar inveja a William Shakespeare.


Eliel gosta de tomar cachaça com tripa assada na barraca de Ponei. Sem o cabaré, a cana e o rio, o poeta não existiria. Outro dia, já neurótico por conta de meia garrafa de Matuta, Eliel aliviou suas perturbações mentais escrevendo esse singelo poema sobre uma cachaça mal tomada:

Chegando em Itabaiana,
Numa festa de São João,
Enchi a cara de cana
E fiquei meio doidão.

E pra agravar a desgraça
Eu corri pra Gruta Azul
Beber mais uma cachaça
Ai, eu tomei no quengo...

Porque, desorientado,
Fui parar no cabaré.
Peguei ali um veado
Pensando que era mulher.

Eu o chamei de princesa.
De rainha e coisa e tal,
Mas peguei num pé de mesa
Que era um tremendo pau.

De medo fiquei inchado
Igualmente um cururu
Pensando que o veado
Ia botar pra valer...

Então para me livrar
De uma baita lambedeira,
Eu saí feito um preá
Desgraçado na carreira.

E desse dia pra cá
Posso estar cheio de mé
Mas nunca mais vou passar
Na porta de um cabaré.




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