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quarta-feira, 4 de junho de 2014

Plante seu pé de coentro, mas não esqueça da jaqueira


Saí da leitura do livro "Jogadores de ilusões", do mestre José Bezerra Filho, com pena da minha frouxa pena e inveja boa da vida em festa que desponta dessa obra, porque o que vi foi escrita com sabor de doce de jaca em calda ou xarope de caldo de cana e pão doce. O livro traça o roteiro do ego do dramaturgo autor de “Enquanto não arrebenta a derradeira explosão”, no embalo dos seus queixumes de menino pobre que conseguiu pular o muro da exclusão social, virou escritor, teatrólogo, musicista e cineasta.

Em dado instante da vida, aos setenta e cinco anos, o mestre José Bezerra Filho vê chegar o outono na cabeça embranquecida e nas lembranças de muitos temporais. Quer viver o aqui e agora. “Estou na idade de plantar pé de coentro porque sei que vou colher daqui a quinze dias; não tenho mais tempo para plantar um pé de jaca da qual não irei colher os frutos”, disse ele em meu programa de rádio. Não condeno quem coloca seus desejos e interesses em primeiro lugar.

Os castelos que erigi sozinho jazem no abandono. As jaqueiras que um dia plantei, umas deram frutos, outras não. Os limoeiros, as laranjeiras que cresceram com meu incentivo entusiasta e minha cota de terra fértil, continuam produzindo sementes.

Semeador contumaz, adquiri o costume de deitar sementes na terra para fazer germinar, como na parábola do Mestre J. C. Umas sementes caíram entre pedras, foram comidas pelas aves, queimaram ao sol. Outras, entretanto, caíram em boa terra, brotaram e cresceram. “Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça”, disse J. C. à multidão. Esses grãos que brotaram produziram cem arrobas de trigo, que por sua vez se multiplicaram ao infinito. Não planto para comer hoje, nem guardo para amanhã. No leque azul das minhas alegrias, anoto contente tantas colheitas, e por elas continuo a criar e plantar para que seja mais ameno meu calvário e as minhas dores não sejam tão lancinantes quando não puder mais revolver a terra no meu roçado de sonhos.

Nesse tema de agricultura social, lembro um homem que é exemplo de cidadania e generosidade. Hélio da Silva é um paulista que cultivou com as próprias mãos e de forma totalmente voluntária mais de 16 mil árvores na beira do rio Tiquatira, na zona leste de São Paulo.

As motivações de Hélio para a empreitada são puramente altruísticas: deixar um legado para a cidade onde viveu por tantos anos. Seu desejo é que as próximas gerações não só desfrutem da área verde, mas também se inspirem com sua atitude. "O João Pedro [meu neto] um dia vai falar pro filho dele: seu bisavô plantou isso aqui. E provavelmente meu bisneto vai falar pro filho dele a mesma coisa. Talvez isso estimule, talvez algum deles resolva seguir com esse trabalho”, contou Hélio.

Assim é dividida a humanidade, entre os que plantam coentro e os que plantam jaqueiras.


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