O título deste texto é claramente sensacionalista,
sendo que nada tem a ver com ajuste de contas com nenhum dirigente de
instituição ou país. Deu-me na cabeça utilizar este estratagema para atrair a
atenção dos eventuais leitores, aproveitando o rebuliço político. Por mais que
eu me enxergue vítima das atitudes bonapartistas, do improviso e da
mediocridade desse chefe que se despede, melancolicamente, da cadeira
presidencial, sou um respeitador da vida. Até uma simples barata merece deste
que vos fantasia uma tolerância e piedade digna dos semi santos. Estranhou o
“semi santo”? Não tem a semi joia? Pois, que haja o semi santo, aquele que não
pode ser consagrado na galeria dos santos, porém nunca jogou pedra na cruz nem
mordeu a mãe ao nascer. “Escrever é também uma forma de exercitar o perdão”,
conforme escreveu o destacado cronista Samarone Lima.
Esclarecida esta parte, comunico minha candidatura
à Presidente da Academia de Cordel do Vale do Paraíba, apesar de ser um
elemento substancialmente antissocial, ao contrário do meu competidor, um
sujeito tão popular que chama até os cachorros de rua pelos respectivos nomes.
Acredito, entretanto, na força do meu discurso. Vou abrir a caixa das promessas
com gosto, como se não houvesse amanhã. Depois que eu montar meu palanque, é só
acompanhar o projeto do poeta Jessier Quirino no seu “Comício em beco
estreito”:
Aí
é subir pra riba
Meia
dúzia de corruto
Quatro
babão, cinco puta
Uns
oito capanga bruto
E
acunhar na promessa
E
a pisadinha é essa:
Três promessa por minuto
Falando sério, chegou o momento deste que vos
ortografa comandar a nave dessa entidade que fundou em 2015. Nesses sete anos,
aprendi muita coisa com meus diletos confrades e confreiras. Foram dois
antecessores presidentes, ambos se esmerando na construção de uma corporação
frágil como os versos metrificados e amalucados do destrambelhado poeta Zé
Limeira. Foram levantando a parede lentamente, concentrados no ofício de
fortalecer uma entidade sem fins lucrativos e sem motivações políticas, além de
carecer de recursos mínimos para alugar uma sala e montar uma oficina de
serigrafia, sonho recorrente da Academia de Cordel. Porém, o intuito maior foi
quase alcançado: unir a galera paraibana produtora desse gênero literário que,
atualmente, é Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. Quase imaterial é
também nossa Academia, com muita aspiração e inspiração, mas, sem sede própria
ou alheia. Funcionamos nas garagens e salas dos amigos, havendo algo de
encantador nesse ambiente, uma afetuosidade e zelo uns pelos outros, aquilo que
se caracteriza como fraternidade dos que lutam pela mesma causa.
Confesso que sou um elemento incrédulo com relação
às divindades. Tenho, entretanto, devoção respeitosa pelos adoradores e crentes
no fantástico e nas coisas do além. De minha parte, acredito no homem como
redentor de si mesmo e sou comungante do ritual da humildade. Assim sendo, ao
ser eleito Presidente, decretarei o fim da expressão “meu Presidente”,
usualmente empregada pelo séquito de bajuladores de todos os naipes, que os há
tanto no Palácio da Alvorada como na mais simples associação de bairro.
Revogue-se os dispositivos referentes à prática do chaleirismo e puxa-saquismo,
cujo patrono é o personagem Genelício, do romance “Triste fim de Policarpo
Quaresma”, do escritor Lima Barreto. O dito cujo Genelício consagrou-se hexa
campeão como o mais bajulador, submisso e capacho dos funcionários públicos. O
safado lavava as mãos quatro vezes para apertar a mão do superior hierárquico,
a quem chamava de “meu divino chefe”. Fui colega de um adulador que levava
diariamente uma flor branca em copo d’água para “abrir os caminhos e ajudar o
divino chefe a vencer as demandas”.
Não há lugar na minha cabeça para essas graduações
hierárquicas. Dois séculos atrás, os anarquistas imaginaram um mundo sem
chefes, leis ou políticos. Presidentes, inclusive. O sonho persiste. Não serei
presidente de ninguém. Prefiro apostar no espírito comunitário e nos movimentos
baseados no esforço coletivo. Enfim, não aceitarei votos de puxa-sacos,
escova-botas, xeleléus e pelegos, porque já sentenciava Shakespeare: “Aquele
que gosta de ser adulado é digno do adulador”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário